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101 Albuquerque: revista de história, vol. 16, n. 31, jan. - jun. de 2024 I e-issn: 2526-7280
Juliana Mendes/Arnaldo Vieira Sousa/Flávio Luiz de Castro Freitas
DEMOCRACIA RACIAL, ELITE E A RECEPÇÃO DE ORFEU NEGRO
RACIAL DEMOCRACY, ELITE AND THE RECEPTION OF BLACK ORPHEUS
DEMOCRACIA RACIAL, ÉLITE Y LA RECEPCIÓN DEL ORFEO NEGRO
hps://doi.org/10.46401/ardh.2024.v16.20969
Juliana Mendes
Universidade Federal do Maranhão
https://orcid.org/0009-0007-2736-0507
j.mendes-@hotmail.com
Arnaldo Vieira Sousa
Universidade Federal do Maranhão
https://orcid.org/0000-0003-3526-5351
vieira.arnaldo@gmail.com
Flávio Luiz de Castro Freitas
Universidade Federal do Maranhão
https://orcid.org/0000-0002-7648-0341
avio.luiz@ufma.br
Recebido em 23 de abril 2024
Aprovado em 10 de junho de 2024
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INTRODUÇÃO
O artigo em questão se propõe a analisar a representação de Orfeu Negro
lançada por Marcel Camus em 1959 quando relacionado a outras produções fei-
tas durante a década de 1950 cineastas brasileiros. Esse lme é baseado na obra
nalizada em 1954 por Vinícius de Moraes, adaptada como peça teatral, chama-
da Orfeu da Conceição, um musical inspirado no mito grego de Orfeu, e que foi
RESUMO: A pesquisa em questão busca
compreender como a obra Orfeu Negro, em
todas as suas variações impactou a sociedade
brasileira em âmbitos positivos e negativos.
A obra na versão teatral e cinematográca
recebeu críticas positivas e negativas e trouxe
uma representação plural a respeito do que
se tem como ideia de Brasil. Nesse artigo
compreenderemos através dos conceitos de
democracia racial e elite cultural como Orfeu foi
capaz de causar uma ambiguidade nos debates
sociais.
Palavras-chave: Orfeu Negro;
Democracia Racial; Indústria Cultural; Favela.
ABSTRACT: The research in question seeks
to understand how the lm Black Orpheus, in
all its variations, impacted brazilian society in
positive and negative ways. The work in the
theatrical and cinematographic version received
positive and negative reviews and brought a
plural representation of what we see as the
idea of Brazil. In this article we will understand,
through the concepts of racial democracy and
cultural elite, how Orpheus was able to cause
ambiguity in social debates.
Key words: Black Orpheus; Racial
Democracy; Cultural Industry; Favela.
RESUMEN: La investigación en cuestión
busca comprender cómo la obra Orfeu Negro, en
todas sus variantes, impactó de manera positiva
y negativa a la sociedad brasileña. La obra en
versión teatral y cinematográca recibió críticas
positivas y negativas y trajo una representación
plural de lo que entendemos como la idea de
Brasil. En este artículo entenderemos, através
de los conceptos de democracia racial y élite
cultural, cómo Orfeo fue capaz de provocar
ambigüedad en los debates sociales.
Palabras clave: Orfeo Negro; Democracia
Racial; Industria Cultural; Barrio Bajo.
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transferido para um morro brasileiro na contemporaneidade da época. A ques-
tão do nome de “Conceição” para “Negrofoi modicada apenas por uma ques-
tão comercial. O lme por possuir capital estrangeiro foi elaborado para ser visto
no exterior, Conceição não faria tanto sentido ou seria atrativo aos estrangeiros
quanto Black Orpheus, título conhecido em inglês. Para a pesquisadora de cinema
Lúcia Nagib A visão da cultura negra como expressão espontânea da natureza
encontrava ressonância em meio a esquerda mundial, que começava a despertar
para a causa africana e dos afrodescendentes” (NAGIB. 2006, p. 128).
Orfeu tem representações teatrais que remontam a óperas desde o sécu-
lo XVII, como L’Orfeo de 1607 de Claudio Monteverdi, que foi uma das primeiras
montagens ocidentais do mito. Na história grega, Orfeu de Trácia era um mortal,
artista virtuoso, corajoso e que tocava lira. Em uma de suas aventuras ele co-
nhece Eurídice e eles se apaixonam, casam e sofrem maus presságios. Um dia
Eurídice, ao escapar de Aristeu, um apicultor que também era apaixonado por ela
e que a estava a perseguindo, corre pela mata em fuga e é picada por uma cobra
venenosa, e parte ao mundo de Hades, Deus dos Mortos.
Orfeu cai em tristeza e pede a seu avô, Zeus, Deus Supremo, que a salve, mas
Zeus arma que que não poderia interferir nas decisões de seu irmão Hades, e
ofereceu que Hermes, Deus das Magias e das Viagens, que o acompanhasse até
o mundo dos mortos para que assim Orfeu resgatasse sua amada.
Orfeu implorou a Hades, tocando sua lira, que encantou todos. Assim Hades
diz a Orfeu que ele tem permissão de voltar com Eurídice ao mundo dos vivos,
com a condição de que sempre olhe para a frente enquanto Eurídice deve passar
a viagem atrás, o seguindo. Caso contrário, Orfeu a perderia.
Próximo à saída, ele se vira para ter certeza que Eurídice o seguia e assim ela
foi puxada de volta ao mundo dos mortos. Orfeu jamais foi feliz novamente, vivia
por tocar canções tristes com sua lira, e resistia aos encantos das Mênades, que
são Ninfas seguidoras de Dionísio. Um dia, com raiva pelo desprezo, as Ninfas
matam Orfeu e, após sua morte, seu espírito reencontra com Eurídice no Mundo
dos Mortos.
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São vários os motivos do tema de Orfeu: o diálogo com animais e a natureza onde vi-
vem; a procura pela origem dos homens e a divulgação disso; a busca do Velocino de
ouro; a busca do amor perdido; a culpa pela separação denitiva deste mesmo amor; a
experiência da descida ao Inferno, que gera um conhecimento singular, tudo isso mo-
vido pelo canto, expressão pessoal transformadora, que a tudo toca e cuja ação ritual
abre caminhos para a espiritualidade. O Orsmo, iniciado após a descida de Orfeu ao
Inferno, proclama e promove o encontro eterno entre homens e deuses, inimaginável
pela religião ocial grega (OLIVEIRA. P. 19, 2006).
A história de Orfeu se modicou atras dos séculos, foram feitas monta-
gens em diferentes países como qualquer mito, que se transformam outra obra.
Assim Orfeu perde sua lira e ganha um violão, deixa os bosques e mora na favela,
em um país não mais no Velho Mundo, mas sim em um lugar tropical no século XX.
A ELITE BRASILEIRA DA DÉCADA DE 1950
Em meados do século XX, no Brasil, havia algumas referências literárias
e ideias de democracia racial, como mostrado nas obras de Sergio Buarque de
Holanda e Gilberto Freyre. Completamente opostas à eugenia que se propagava
no início do século, que apontava que a nossa miscigenação era responsável pelo
atraso social e econômico do país. Para Sérgio Buarque de Holanda:
Para estudar o passado de um povo, de uma instituição, de uma classe, não basta acei-
tar ao pé da letra tudo quanto nos deixou a simples tradição escrita. É preciso fazer fa-
lar a multidão imensa dos gurantes mudos que enchem o panorama da História e são
muitas vezes mais interessantes e mais importantes do que os outros, os que apenas
escrevem a História (1985, pp. 173 – 174).
Para Buarque de Holanda nós temos uma diculdade de construção iden-
titária no que se refere ao que é “ser nação brasileira”. O fator de ter sido colo-
nizado por povos portugueses que eram um povo com histórico de mestiçagem
devido a sua localização geográca, que tardiamente se integrou à Europa e isso
contribuiu para uma certa plasticidade, mas insuciente para os europeus olha-
rem o Brasil com sentimento de desdém. Essa miscigenação nos fez desenvolver
a pluralidade cultural porque somos a inserção de muitos povos em um espaço
com dimensões continentais.
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Vivemos nos trópicos sem uma cultura adequada própria, tropical. Participamos do
desenvolvimento da cultura de um outro lugar [...] Entre o conhecimento do Brasil e a
realidade brasileira uma defasagem abissal; pensamos com ideias inadequadas à
nossa realidade social, ideias que, ao invés de facilitarem nossa relação com a realida-
de, a impedem (Reis, 2007, p. 123).
Podemos ter a percepção de que nesse fator de colonizado e colonizador e
as nossa clássicas obras literárias, para Freyre, Casa Grande e Senzala apresen-
tava um espirito nostálgico colonial e que para Buarque de Holanda essa senti-
mento deveria ser transformado para que a identidade brasileira de fato pudesse
surgir, demonstrar o sentimento de brasilidade que não deveria se portar como
uma ideia única e xa.
Na década de 1950, o país também foi marcado pela industrialização, cres-
cimento econômico, consumo de bens culturais. Para a população negra havia
uma disparidade social e econômica em relação aos brancos, mas uma inserção
mesmo que subalterna em espaços da sociedade em que antes eles eram manti-
dos em completa exclusão.
A população negra começou a ganhar mesmo que de maneira precária e ín-
ma espaço nas escolas, universidades, industrias midiáticas. Algumas dessas
mobilizações foram frutos das próprias ações das populações negras por meio
de associais culturais, esportivas, eventos como a Convenção Nacional dos Ne-
gros Brasileiros, pelos periódicos da imprensa negra, como Alvorada e Senzala.
Além da inserção no meio político.
A população brasileira vivia de maneira dúbia. Existiam as Elites econômi-
cas que pautavam a divisão racial, mas também a Elite Cultural que reforçava o
mito das 3 raças formadoras do Brasil que conviviam de maneira harmoniosa.
Mas essa ideia de cordialidade era refutada pelos grupos negros e entidades an-
tirracismo.
Os jornais da época, assim como o cinema mostravam o Brasil como um país
de amabilidade, mas não era incomum caricaturas, noticias de preconceito con-
tra negros, indígenas e até judeus em periódicos. Situações essas que para a po-
pulação vista como branca eram apenas casos isolados.
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ORFEU DA CONCEIÇÃO: TRAGÉDIA CARIOCA
Vinícius de Moraes, na década de 1940, começa a frequentar favelas, ter-
reiros de candomblé, espaços ocupados por negros e associou as celebrações
à Grécia, devido à música, um sentimento dionisíaco. A partir dessa correlação
com o Rio de Janeiro, ele construiu um paralelo com o mito de Orfeu e iniciou sua
obra prima em 1942, a engavetou por uns anos até posteriormente naliza-la em
1953.
A ação situa-se no tempo presente, num morro, que poderia ser, não importa o qual da
cidade, e todas as personagens são gente de cor e isto por uma razão muito simples:
procurei dar a trama a mais completa unidade do ponto de vista da dramaturgia. A in-
tromissão de personagens brancas criaria certamente na entrosagem psicológica das
guras, elementos alheios à tragédia tal qual ela se desenrola - o que não quer dizer
que ela não possa ser representada eventualmente por atores brancos. Mas, me pare-
ce que seria atentar contra o seu espírito por assim dizer helênico, nela colocar atores
racialmente mesclados. O negro possui uma cultura própria e um temperamento “sui
generis”, e embora integrado no complexo racial brasileiro sempre manifestou a ne-
cessidade de seguir a trilha de sua própria cultura (MORAES. p. 1, 1956).
Para Ortiz (2003), o carnaval, sendo a festa mais popular do Brasil, nos permite
que sejamos felizes e esqueçamos a tristeza durante quatro dias de festa, quando
tudo se acaba na quarta-feira. A inuência de se construir Orfeu nesse espaço
pode ter um aspecto também relacionado a movimentos políticos da época, que
estavam buscando a essência do que chamamos de “cultura brasileira”.
No ano de 1956, a peça estreou no Teatro Municipal do Rio de Janeiro em 25
de setembro. Na época causou uma certa polêmica por ser a primeira vez que o
Teatro recebia uma peça representada exclusivamente por atores negros. Para
os críticos especializados a maioria dos comentários foram positivos, havia uma
rejeição por parte da classe média, a burguesia brasileira, isso tudo devido a
estrutura forte de desigualdade racial trazida do período colonial.
Críticos deram suas opiniões publicadas em jornais na época. Gustavo Doria
para o Jornal O Globo, armou que em Orfeu da Conceição “pela primeira vez
encontramos o entrosamento do elemento popular nosso com uma linguagem
poética” (DORIA. p. 7, 1956). O jornalista Antonio Maria, apontou no jornal O Globo
que:
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Antes de mais nada, uma imensa e linda oportunidade de armação artística do negro
brasileiro. Espetáculo bonito e grandioso, sob todos os pontos de vista. [...] Em Orfeu
da Conceição nota-se, sobretudo, a ausência das conspirações da ignorância e da in-
sensibilidade. O momento mais emocionante da noite da pré-estreia de gala foi quando
a personagem negra, Mira, recebeu no palco uma enorme “corbelle”. Foi a primeira vez,
no Brasil, em que um branco deu or a preto. Até hoje preto só recebeu de branco or
que murchou nos jarros e assim mesmo com esta recomendação expressa: “Tome. Vá
botar no lixo”. Parabéns a todos que zeram Orfeu da Conceição (MARIA. p. 2, 1956).
Ao mesmo tempo Maria também expressou no Jornal O Globo certa irritação
com o fato de que alguns críticos, talvez por não estarem habituados a um elenco
negro com tanto protagonismo se atentarem a falhas simples que ocorrem em
todos os inícios de uma temporada teatral.
As falhas de “Orfeu da Conceição” são ainda as falhas fatais de todas as coisas difíceis,
que se fazem pelas primeiras vezes. E basta que se tome o negro brasileiro como um
estreante de teatro (quando os brancos ainda não são esses talentos) para que se con-
descenda com certas minúcias, a que faltaram realces. Devemos consideram que, no
Brasil, essa história de branco bater palmas para preto, fora do futebol, é uma novidade
de quatro ou cinco anos pra cá. E a plateia aplaudiu de pé (MARIA. p. 2, 1956).
O lançamento da peça, pela importância de tratar de uma temática negra na
metade do século XX se tornou uma data marcante na memória cultural brasilei-
ra. Elsie Lessa no Jornal do Brasil menciona que:
Não sei, em nosso teatro, de coisa mais universal, porque tão brasileira, do que esta
tragédia musicada do morro carioca, com seu despojado cenário de pobreza e o ritmo
envolvente do samba, da capoeira, da batucada, aliada à espantosa riqueza plástica
do negro, [...]. Ninguém como o poeta Vinícius, tão musical ele mesmo, tão perto dos
essenciais da sua gente, para pôr no palco, com lirismo e pureza de que só ele era ca-
paz o poema plástico e comovente que é o seu Orfeu da Conceição (LESSA. p. 1, 1956).
Orfeu, interpretado por Haroldo Costa, é um compositor e sambista, um vir-
tuoso violonista, morador de uma favela carioca. A história se passa durante o
carnaval, quando o protagonista conhece e se apaixona instantaneamente por
Eurídice, que acaba de chegar à cidade do Rio de Janeiro após armar que esta-
va sendo perseguida por um homem que queria lhe matar. Esse amor repentino
desperta a fúria em Mira de Tal, noiva de Orfeu e as consequências da história são
paralelos com a lenda grega.
A peça foi um marco na cultura nacional porque o elenco era composto ex-
clusivamente por negros e fez sucesso de crítica e de público em uma época em
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que negros no Brasil eram até proibidos de entrar em certos ambientes. Moraes
ao realiza-la buscava fazer uma homenagem ao negro brasileiro. Para ele, era a
cultura desse povo que foi responsável por uma construção orgânica e boa do
país (DIAS; CARRASCO, 2011).
No programa original, destaca que o negro possuía uma cultura própria e um compor-
tamento “sui generis” que embora integrado no complexo racial brasileiro, sempre ma-
nifestou a necessidade de seguir a trilha de sua própria cultura, prestando assim uma
contribuição verdadeiramente pessoal à cultura brasileira em geral (DIAS; CARRASCO,
2011).
Ao transferir o mito de Orfeu da Grécia para o Brasil, Vinícius de Moraes ten-
ta transparecer aquilo que ele considera a essência nacionalista. Troca o lirismo
pelo carnaval, pelo samba, movimento autêntico nosso resultante das estruturas
musicais dos três povos, europeus, indígenas e africanos, que mais contribuíram
na formação do que somos hoje.
Como nas produções cinematográcas que surgiram posteriormente, Orfeu
da Conceição mesmo contando com elenco negro, a equipe técnica era compos-
ta por brancos, problemática existente até a contemporaneidade devido a for-
mação desigual do nosso país, uma estrutura que exclui aquele que não é visto
como branco. A música foi composta por Vinícius de Moraes e Tom Jobim, dire-
ção de Leo Jusi, cenários de Oscar Niemayer.
A peça foi um sucesso, houve críticas mistas, era um período conservador
em que alguns queriam expor que o Brasil era um país com união de raças, en-
quanto outra parcela queria esconder a negritude. Apesar disso, a peça não so-
freu com tantos boicotes quanto produções posteriores, a exemplo da versão
brasileira de Hair (dirigida por Ademar Guerra), lançada 1969, em um período em
que enfrentávamos uma Ditadura Militar e que possuía um elenco composto por
diferentes raças.
A musicalidade de Tom e Vinícius atraiu interesse que não os isentaram de
críticas, para alguns eles não conseguiram transmitir a melodia da música feita
pelo povo negro. Em uma crítica publicada pelo Correio da Manhã, por Claudio
Murilo em 6 de setembro de 1956:
Pedimos desculpas aos estrangeiros que foram ao Municipal esperando ouvir música
de morro e foram aquinhoados com um pouco de suas próprias músicas ou foram agra-
ciados com a batucada do segundo ato, digna dos músicos da Confeitaria Colombo,
pelo seu sabor insosso, falta de molejo, etc... uma batucada acadêmica, no mau senti-
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do. Finalmente, pedimos desculpas aos próprios sambistas de morro por esta usurpa-
ção da qual eles não terão notícia e continuarão a compor tranquilamente aquilo que
passará para a história do nosso populário como música popular brasileira.
A peça possui algumas diferenças do lme e do mito, mais personagens in-
seridos, mais destaques a alguns, trocas de nomes, como Orfeu ser lho de Clio
e o Calíope, seu pai é Apolo, ele que ensina o lho a se tornar um virtuoso vio-
lonista. No lme de 1959 não temos a presença de Aristeu, em 1999 ele aparece
com outro nome, sendo amigo do protagonista e também apaixonado por Eurídi-
ce. A morte é a Dama Negra, não apenas um perseguidor como no lme de 1959.
Na peça, após a morte de Eurídice, Orfeu tem como destino trágico ser assassi-
nado por todas as mulheres que ele decepcionou, lideradas por Mira de Tal, que
atiram facas e navalhas contra ele.
ORFEU CHEGA AS TELAS
Esse sucesso causado no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, levou a peça
Orfeu da Conceição a conseguir repercussão mundial. Vinicius, no ano de 1955,
em uma de suas viagens à França, conheceu Sacha Gordine, que decidiu produzir
seu lme. A relação entre cinema e atividade intelectual não ocorre de maneira
abrupta. É pautada a ideia de que elas se fundem atras da necessidade de se
conectar a massa com a erudição.
No ano de 1958, o produtor Gordine começa a conceber junto a Vinícius de
Moraes o lme que viria a ser dirigido pelo ainda desconhecido Marcel Camus
no ano seguinte. Orphée Noir, título em francês, é uma produção franco-italiana,
gravada no Brasil e com trilha sonora de Luís Bonfá, Vinícius de Moraes e Tom
Jobim.
Bourdieu (2006) demonstra que, conforme essa discussão se propaga, ob-
servamos uma conversão do capital simbólico em econômico, transferindo isso
para o universo cinematográco, pensamos quando um diretor tem poder de fa-
zer um lme e intervir na burocracia que se produzir cinema, foi exatamente o
que a França conseguiu fazer ao gravar um lme no Brasil. Eles como um país de
poder econômico superior conseguiram dominar o processo de produção de Or-
feu Negro, assim como são capazes de fazer em outras coproduções com países
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com economia menor.
O Orfeu de Camus não almejava ser um lme que retrata a realidade por com-
pleto. Crua como ela é, com desigualdade de um país ex-colonial. Ele foi feito em
um período pós-guerra, a imagem romântica e leve era o que o europeu queria
ver naquele momento.
As imagens coloridas e as músicas chocaram o público, que não estava muito acostu-
mado a assistir a lmes produzidos fora da Europa e da América do Norte. Mesmo sen-
do uma variação sobre um imaginário brasileiro construído, o lme trazia emoções
novas e parecia muito mais real do que letras de música ou livros cientícos (FLÉCHET.
2009, p. 58).
O lme foi lmado inteiramente no Brasil, partes durante a festa de carnaval.
Em aproximadamente 3 meses o restante das lmagens ocorreu no morro da Ba-
bilônia, na Avenida Rio Branco e em cenários construídos em galpões.
A produção mostra uma história parecida com o que foi a peça. Orfeu in-
terpretado por Breno Mello, é um homem galanteador, exaltado principalmente
pelas crianças da comunidade pela sua forma de tocar violão e pela sua bela voz.
Assim como na peça, continua sendo um motorista de bonde e sambista, mo-
rador do morro e noivo da exuberante e sensual Mira de Tal, a quem ele não de-
monstra afeto.
Mira é apenas um objeto de conveniência, para passar o tempo, chegando a
ser tratada com desprezo em certos momentos, mas ela tenta se impor e não ser
apenas usada. Orfeu a abandona ao conhecer a ingênua Eurídice, que se apaixo-
na à primeira vista sem demonstrar. Ela está fugindo de alguém que lhe persegue
e se abriga na casa de sua prima Serana, com o morro é o seu porto seguro, pois
lá a morte não lhe alcança.
Orfeu demonstra explicitamente o interesse em car com Eurídice e mesmo
com o noivado dele, ela parece o se importar com o comprometimento dele e
acredita no amor instantâneo que sentem um pelo outro. Na terça-feira de car-
naval ela desce do morro, vestida com as roupas de sua prima Serana e um véu
cobrindo o rosto, para car com ele na festa e nessa ida ao asfalto no centro da
cidade é que o perigo a persegue novamente.
Na segunda de carnaval o homem vestido de morte sobe o morro, observa
Eurídice pela janela e quando Orfeu e desaparece em um barranco, o desenrolar
da história no último dia de carnaval é um cenário com Eurídice vulnerável, en-
quanto seu perseguidor a procura para lhe matar. Ao mesmo tempo Mira de Tal
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se sente usada por Orfeu, nutrindo tristeza e raiva.
No asfalto, durante a festa de carnaval, Orfeu procura de Eurídice após ter a
perdido, pois ele sabe que ela corre risco de vida. Após uma briga Mira de Tal ar-
ranca o véu que escondia o rosto de Eurídice. Esse desencontro na madrugada da
festa, de terça-feira para a quarta de cinzas acarreta em um nal trágico. Ao ver
que está vulnerável ela corre e cai nos braços da Morte, escapando novamente e
correndo atrás de seu amado em meio ao desle de carnaval.
O lme alavancou a carreira de Camus, que ganhou a Palma de Ouro e Oscar
de melhor lme estrangeiro. Prêmios que caram com a França e importaram
uma imagem fantasiosa e, por vezes, controversa do Brasil. O lme teve produ-
ção francesa e uma equipe técnica branca. Fazer cinema era caro e a branquitu-
de que possuía os meios de produzir audiovisual. Gordine não possuía verba o su-
ciente, então contou com uma pequena parte da Companhia Cinematográca
Vera Cruz, empresa brasileira, além da montagem da peça que ajudou a nanciar
a produção.
A RECEPÇÃO DE ORFEU NEGRO PELA CRÍTICA AO REDOR DO MUNDO
A representação de Camus é a de uma população moradora do morro, que
mesmo vivendo com todas as diculdades e pobreza, era feliz, passiva, inocente
e alegre. Essa reação é advinda desde que cineastas estrangeiros começaram a
representar o Brasil nos anos 1930, 1940, lmes como Voando para o Rio (dirigido
por Thornton Freeland , 1933) e Uma Noite no Rio (dirigido por Irving Cummings,
1941), além do estrondoso e estereotipado sucesso de Carmen Miranda ajudaram
a consolidar a imagem brasileira um país tropical, cheio de exotismo, sensualida-
de e felicidade. No Jornal O Globo, Lessa, exalta o lme após Orfeu Negro ganhar
a Palma de Ouro que:
(...) assistir a esse lme fora do Brasil é comprar passagem, no dia seguinte, cedinho,
no primeiro navio ou avião que venha a este rumo. Dizem que Rosselini chorava, ao
abraçar Clouzot, emocionadíssimo, depois da sua apresentação no Palácio do Festival.
É bem capaz. Nunca vi, na tela, cidade mais linda que esse Rio de Janeiro do “Orfeu Ne-
gro”: é de dar gritos, de tirar o fôlego, de trazer mesmo lágrimas aos olhos. (...) é capaz
de ser responsável por uma inesperada avalancha do turismo. (...) É um legítimo orgu-
lho patriótico para todos nós, uma boa amostra da festa pagã e dionisíaca, do carnaval
carioca. É a primeira vez que um lme ideia do que seja, em verdade, um carnaval
carioca, sua beleza, sua alegria, sua tragédia, seu ritmo de arrastante contágio. (...) O
cineasta Marcel Camus deu extraordinária prova de sensibilidade ao surpreender, tão
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bem, em tão pouco tempo de convivência conosco, certos aspectos da vida humilde
das favelas e o que representa, para elas, o carnaval, como as cenas do penhor, os en-
saios das escolas de samba, certos “takes” da Avenida (LESSA. p. 1, 1959).
Imagens que para os estrangeiros eram como “reencenações ou desloca-
mentos de elementos ligados a suposta formação histórica do país (o Brasil como
paraíso perdido) e à idealização de uma suposta alteridade (as mulheres sensuais,
a democracia racial)”. (FREIRE – MEDEIROS. 2009, p. 58). Era visão de um diretor
de um país de 1º mundo em relação a um que outrora foi colônia e ainda estava se
estruturando economicamente, com as cidades ainda passando pelo processo
de urbanização.
Os diplomatas do Itamaraty, políticos e a burguesia em geral, antes mesmo
do lançamento do lme, devido a existência da peça temiam que os persona-
gens negros e as favelas fossem mostrar uma má imagem do Brasil para o mun-
do. Vinícius de Moraes em entrevista de 1967 a equipe do Museu da Imagem e do
Som relatou que:
Os capitalistas achavam que a gente fazia lme sobre os assuntos errados, que não ti-
nha nada que mostrar favela, que devia fazer um lme bonitinho, [sobre] o Copacabana
Palace e os ambientes bonitos daqui… Inclusive, as coisas precisam ser ditas porque
as pessoas precisam saber delas mais tarde, o então embaixador em Paris, Embaixa-
dor Alves de Sousa, lutou fortemente contra o lme ser mandado para o Festival de
Cannes porque era um lme sobre negros.1
O lme ao conquistar o mundo levou também a musicalidade própria do Bra-
sil para todos os cantos. Ele alavancou o Brasil como destino turístico por mostrar
nossas paisagens que para os estrangeiros eram exóticas, e músicas que feitas
através da união de raças que só existem no país, formaram ritmos exclusivos.
O trompetista Dizzy relatou em sua biograa episódios presenciados no Bra-
sil e a forma como nossos ritmos inspiraram o seu Jazz.
Minha primeira exposição ao samba foi na trilha sonora do lme Orfeu Negro, e quan-
do eles começaram a tocar, pensei: “Eu tenho alguns irmãos embaixo?” Chegando
no Brasil, descobri que existiam e que a nossa música tinha um vínculo comum. Eu
realmente senti uma conexão, quando me levaram para uma escola de samba no Rio
de Janeiro. (….) O samba é a bossa nova, e a bossa nova é uma versão negra do samba.
Ouvi samba ao vivo pela primeira vez, quando zemos uma turnê pela América do Sul.
Você realmente pode aprender muito sobre o ritmo deles, especialmente no Brasil. (…)
fomos os primeiros nos EUA a tocar essa música, o samba, no contexto do jazz. Tive-
mos muito samba, e Stan Getz costumava me cobrar até a morte tentando conseguir
1  Museu da Imagem e do Som – Rio de Janeiro. Arquivo sonoro. Ciclo Depoimentos de Música Po-
pular: Antônio Carlos Jobim, 25/08/1967.
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reproduzir essa musicalidade (GILLESPIE, 1985, p. 428-431).2
Essa questão do colonizado e do colonizador ca evidente quando sabemos
que já durante a produção, Camus e Vinícius de Moras começaram a ter conitos,
direitos autorais das músicas, feitas em parceria com Tom Jobim, devido à falta
de créditos até questões de roteiro.
Foi uma das maiores decepções que eu tive na minha vida. Eu não tinha visto o co-
pião e estava em Montevideo quando recebi a notícia de que o lme havia recebido a
Palma de Ouro em Cannes. Aí eu pulei e vibrei, torci à beça, achei que eles tinham acer-
tado na mosca. Depois, quando cheguei aqui, o [presidente] Juscelino [Kubitschek]
me convidou para a primeira exibição privada, no palácio, junto com sua família, e dois
ou três sujeitos da produção. Eu tive um choque tão grande durante a projeção que me
esgueirei e fui embora. Senti que não poderia enfrentar aqueles franceses quando as
luzes acendessem. Eu era capaz de partir pra porrada com eles (MORAES, 2003, p. 42).
Foram essas opiniões que corroboraram para o lme se situar em uma posi-
ção controversa, de que representa ou não a cultura brasileira. E outro ponto de
crítica é que devido às premiações, o reconhecimento da obra parece ter cado
apenas com a França. A mídia francesa da época sequer citar o nome de Vinícius
de Moraes como criador da obra externou nele um sentimento de fazer uma re-
lmagem devido a uma frustração. Era a cultura brasileira, negra, sendo levada
para fora e sem trazer o retorno. Parte do orgulho da conquista de ter aqueles
prêmios valorizados por varias nações.
O INCÔMODO DOS CINEASTAS E DE UMA PARCELA DE BRASILEIROS
Em Orfeu Negro era como se diante de toda aquela dura realidade o hou-
vesse espaço para ser triste, era carnaval. E o lme queria apenas contar uma
história de amor. Não necessariamente fazendo uma crítica a forma como a po-
breza afetava nossa nação. No entanto, esse retrato de Brasil recebeu críticas de
todos os lados.
No livro de Moraes a formação da identidade é dúbia. Ele busca representar
o negro e o morro que formam a identidade brasileira, mas ao mesmo tempo o
olhar dele e daqueles que detinham o capital cultural e o meio de se fazer cine-
2  Tradução livre da autora.
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ma, teatro e outras obras, eram majoritariamente brancos, pertencentes a clas-
se média.
Em Orfeu Negro, o lme, são escancarados vários estereótipos que reforça-
ram uma noção de república das bananas que tínhamos no imaginário europeu e
estadunidense. Pessoas constantemente sambando em meio a pobreza genera-
lizada, clichês de um comerciante estrangeiro que galanteia todas as mulatas do
morro.
Essa situação causou incomodo de maneira dúbia, um por apresentar um
país apenas com felicidade mesmo com a pobreza e por outro lado por expor o
racismo que existe na sociedade brasileira que queria se desvincular de ser co-
nhecido como um país de negros.
No decorrer da década de 1960, a falta de veracidade do lme foi denuncia-
da por vários críticos brasileiros, que usavam o Orfeu Negro como um modelo do
que não deveria ser feito no cinema brasileiro: o exotismo, o retrato animalesco
de Camus era o que se deveria evitar.
O lme Orfeu Negro enveredava por visão exótica e turística da cidade, o que traía o
sentido da peça e passava muito longe das suas fundadoras e fundamentais qualida-
des. Saí do cinema sentindo-me pessoalmente ofendido. Passei então a sonhar com o
lme que veio a se tornar o meu Orfeu, realizado 40 anos depois. Nosso Orfeu não era,
portanto, nem de longe um remake do Orfeu Negro de Camus, mas sim um novo lme
baseado na mesma peça” (DIEGUES, 2003, p. 18).
O conservadorismo não queria que os países ricos olhassem o Brasil como
um país de negros e pobres, enquanto a esquerda intelectual criticava a falta de
profundidade no discurso, o estereótipo docilizado de que o povo brasileiro é fe-
liz o tempo todo e aguenta sofrer. Ele gerou opiniões diversas entre os que cons
A REAÇÃO DOS CINEASTAS BRASILEIROS APÓS O ORFEU DE CAMUS
Enquanto ocorriam discussões sobre o retrato do Brasil em Orfeu Negro,
surge um movimento feito por cineastas jovens, inspirados no que estava se fa-
zendo no eixo Rio de Janeiro-São Paulo. Era um movimento que buscava me-
nos alienação social, buscava criticar duras realidades, e se voltava muitas vezes
para o centro e nordeste brasileiro tendo como gura mais conhecida o cineasta
Glauber Rocha, mas que teve nomes como Paulo Cesar Saraceni, Cacá Diegues
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e Leon Hirszman. Foi denominado de Cinema Novo. Para Bentes, a intenção era:
(...) violentar a percepção, os sentidos e o pensamento do espectador, para destruir
os clichês sobre a miséria: clichês sociológicos, políticos e comportamentais. Glauber
[Rocha] propõe uma Estética da Violência, capaz de criar um intolerável e um insu-
portável diante dessas imagens. Não se trata da violência estetizada ou explícita do
cinema de ação. Mas de uma carga de violência simbólica, que instaura o transe e a
crise em todos os níveis” (2007, p. 243).
Desde o início da produção cinematográca brasileira, não havia exatamen-
te uma representação total do que seria Brasil e os brasileiros. Nós tínhamos
muitas comédias e musicais, lmes que retratavam exuberância, os moradores
do asfalto, mas não o Sudeste pobre, outras regiões do país e não havia espaço
para o drama. Para Bernardet, a nova geração da época tinha desejo de levar o
espectador a conhecer a realidade crua, que ocasiona posteriormente em novas
correntes fílmicas.
(...) o público não tem o hábito de ver-se na tela, e as identicações que pode fazer com
personagens e situações nunca são baseadas em elementos de sua realidade, de seu
comportamento, vida, sociedade, etc. É tarefa, e das mais urgentes do cinema brasi-
leiro, conquistar o público. (...) A atividade cinematográca no Brasil, no plano comer-
cial e cultural, tem sido no sentido de afastar-se de nós próprios. A realidade brasileira
limitada e esporadicamente recebeu tratamento cinematográco (BERNARDET.
1967, p. 16 – 17).
A crítica dos cineastas de esquerda brasileiros à adaptação de Camus é que
devido à sua visão alegre e feliz do morro, enquanto o espectador poderia ver cla-
ramente casas de madeira com um cômodo, incentivava a inercia do povo para
tentar mudar esse cenário. A visão de Camus foi vista por parte dos brasileiros
como primitiva também. Estereótipos que os intelectuais da época estavam ten-
tando romper de que nossa miscigenação é motivo de atraso.
(...) convertem a pobreza urbana numa espécie de alegoria carnavalesca. (...) reprisam
uma leitura mítica da cidade que pressupõe a alegria estrutural de seus pobres e uma
intensa sexualidade que perpassa o conjunto de seus habitantes. (...) Apostam em um
certo poder regenerativo peculiar a paisagem carioca que, não seria exagerado ar-
mar, é tematizado em praticamente todas as narrativas sobre o Rio desde sua funda-
ção (FREIRE – MEDEIROS. p. 60, 2009).
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Também podemos pensar que nessa tentativa de mostrar o real e bruto,
havia certa controvérsia na intenção de se fazer cinema na época quando parti-
mos da ótica de quem fazia e de quem era retratado. Os lmes da década de 1950
e 1960 mostravam os moradores dos morros sem preconceito ou caricatura, o
modo de falar, vestimentas e gírias, algo que não era feito. No entanto, não isen-
tava a construção de estereótipos, como aponta Salem (1996), pobres eram bons
e batalhadores e ricos eram corruptos. Em ambos os lados tivemos um estereó-
tipo, uma dualidade, como se fosse um lado bom e mau.
CACÁ DIEGUES REALIZA SEU ORFEU
O retrato fantasioso de Brasil feito por Camus incomodou muitos cineas-
tas brasileiros que queriam mostrar uma face mais real e bruta da realidade de
um país que outrora foi colônia e perpetuava reexos de desigualdade. Em 1987,
Diegues lança Um Trem para as Estrelas, obra que de muitas formas representa
o Orfeu Negro que ele gostaria de fazer. Uma questão estrutural e problemática
do nosso cinema é que essa versão, apesar de querer reetir uma realidade bra-
sileira, é feita majoritariamente por atores brancos na função de protagonismo.
Nessa versão, a trama relata a história de Vinícius/Vina, um homem órfão,
pobre, que mora com a tia em um apartamento pequeno e busca o sucesso como
músico, que após uma noite, tem sua namorada Eunice/Nicinha desaparecida
nas ruas do Rio de Janeiro. O lme mostra um aspecto de pobreza, violência e
injustiça dos grandes centros urbanos. O inferno de Vina são as vielas dominadas
pelo tráco. A busca por sua amada se relaciona ao mito de Orfeu, quando ele
desce ao mundo dos mortos atrás de Eurídice e também faz paralelo com a músi-
ca homônima de Cazuza, trilha do lme, ao relacionar trechos da música a cenas.
Apesar dessa referência feita na década de 1980, após o lançamento de Or-
feu Negro de Marcel Camus, Vinicius de Moraes não cou satisfeito com o re-
sultado e com a falta de reconhecimento, anal a obra é brasileira enquanto os
méritos caram com os franceses. Houve uma tentativa de Diegues de fazer uma
relmagem, paralisada devido à morte de Moraes, em 1980 em meio ao processo
de recriação da obra.
Em 1999, com Toni Garrido e Patrícia França, Diegues lança sua versão inti-
tulada apenas de “Orfeu”. Filme totalmente brasileiro, feito após o movimento da
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Retomada, com suporte da Globo Filmes. E o cineasta queria nalmente retratar
a forma de Brasil com a desigualdade e pluralidade étnica que faltou na versão de
1959.
Cacá tinha consciência que iria enfrentar um lme clássico e de grande destaque. Mas
para ele, o sucesso de Orfeu Negro era algo circunstancial. Considerava o caso do lme
ter caído no gosto do público internacional, a três principais fatores: era a primeira vez
que se via o Rio de Janeiro, que ele considera a cidade mais linda do mundo, a cores no
cinema; era a primeira vez que se ouvia este aquele tipo de música e por m em uma
época de Guerra Fria, com todos achando que mundo iria acabar numa guerra atômica,
o lme surge e apresenta um lugar onde todos são felizes, dançam, cantam e brincam
o tempo inteiro e a única coisa que pode atrapalhar isso é a morte abstrata, não possui
origem social e política (CUNHA. 2014, p. 61).
O lme de Diegues perde a inocência que existia no de Camus, adaptado
para os anos 1990, momento em que o tráco e a criminalidade dominavam prin-
cipalmente os morros cariocas. Orfeu continuava galanteador, virtuoso e, assim
como Vina de Um Trem para as Estrelas, buscava sucesso musical sendo um ho-
mem negro, pobre e que veio da favela e Eurídice se torna, nessa versão, uma
mulher pobre, que veio do Acre, após a morte de seu pai, morar na casa da sua
tia. Ao contrário de Orfeu de 1959, em que os moradores da favela são hospitalei-
ros, Eurídice encontra hostilidade ao chegar no local. Mostra que os moradores
de estão acostumados a violência, tiroteios, fazem parte do cotidiano e resta
sobreviver.
Para o cineasta não era um remake, era uma nova representação, um l-
me fazendo justiça e apontando o contexto real que o Brasil enfrentava, 40 anos
após a primeira versão, em um momento em que a estrutura das favelas já havia
se modicado, havia um aglomerado de barracos, falta de saneamento e outras
políticas públicas.
Toda essa ausência do poder público abre margem para o vilão dessa nova
versão ser o tracante Lucinho, que é uma nova versão de Aristeu, amigo de in-
fância de Orfeu, líder de facção que queria subir rápido na vida mesmo saben-
do que no crime ela poderia ser curta. Para Diegues, o lme não deveria ser um
universo colorido apesar de acontecer nos 4 dias de festa de carnaval. A respei-
to dessa mudança representativa podemos pensar, como aponta a antropóloga
Janice Caiafa:
A etnograa é ao mesmo tempo um tipo de investigação e um gênero de escritura que
se desenvolveu na tradição antropológica. Mas ela surge de fato com outras tradições
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e experiências, sobretudo os relatos de viagem de diversos indivíduos, ilustres ou
não, que por diferentes motivos se encontravam em situação de distanciamento geo-
gráco e cultural (CAIAFA. 2007, p. 135).
O lme foi realizado mostrando pluralidade de cores existentes no Brasil, a
miscigenação, Eurídice é branca, Orfeu é negro. O mito agora nos faz reetir as-
pectos sociológicos e estéticos, ele traz o cenário das favelas de volta às telas,
porque além de um cinema parado, na década de 1990, o sucesso brasileiro era
nas novelas, que mostravam um brasil caucasiano e morador da zona sul. Assim
como Camus, Diegues foi criticado por ambos os lados, mas por sua vez por re-
presentar um Brasil miserável e violento, que por vezes pode reforçar que no país
existe apenas pobreza.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Uma das mais fortes consequências de Orfeu Negro e a inquietação dos
cineastas brasileiros foi o lme Cinco Vezes Favela de 1962. Buscava extrair do
público reexão e ação. São 5 curtas em conectados com direção de Marcos
Farias, Miguel Borges, Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade e Leon
Hirszman. Para Bernardet (1967), o lme possui erros por apresentar uma
sociedade esquematizada. Ele mostra as problemáticas, mas não abre margem
para interpretações.
Além disso, o problema tende a ser apresentado junto com sua solução: o favelado de
Escola de Samba Alegria de Viver toma consciência de sua alienação e troca o samba
pelo sindicato. O resultado dessa estrutura dramática simplista não era um convite à
politização, mas sim à passividade. Pois o espectador não tem de fazer o esforço de
extrair um problema da realidade apresentada no lme: o problema está enunciado
de modo tão categórico que não admite discussão; e, se se quisesse discuti-lo, a rea-
lidade do lme não forneceria elementos para tanto. O espectador tampouco tem de
fazer esforço para imaginar uma solução: ela é dada. O espectador absolutamente não
é solicitado a participar da obra; a única coisa que se exige dele é que ele sente em sua
poltrona e olhe para a tela, nada mais. E só lhe resta uma alternativa: negar o lme ou
entusiasmar-se com ele. O espectador encontra-se diante de um circuito fechado: a
realidade só se abre para um único problema, que está apresentado esquematicamen-
te, o problema tem uma única solução positiva, que também está apresentada esque-
maticamente – e a situação piora ainda quando a solução é tão discutível como no caso
de Escola de Samba Alegria de Viver. O lme fecha-se sobre si próprio, e o espectador,
limitando sua participação a aceitar ou recusar, ca de fora (BERNARDET. 1967, p. 25).
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Cacá Diegues foi um dos cineastas que na época se incomodou com a re-
presentação brasileira em Orfeu Negro, e em 1999 teve a oportunidade de lançar
sua versão, corrigir o que ele imaginava que Marcel Camus havia feito errado. Em
1980 houve uma conversa com Vinícius de Moraes, mas a produção foi paralisada
no mesmo ano devido à morte de do autor. Ele queria retomar o que se fazia em
1950 e 1960, instigar a reexão, o viés sociológico, histórico.
(...) nunca existe uma única visão possível, mas uma visão distinta e uma visão emba-
çada, uma visão nítida e uma visão difusa, uma visão direta e uma visão oblíqua... Des-
crever é sempre descrever a partir de uma perspectiva: ao perto, ao longe, em face, do
lado, de través (LAPLANTINE. 2004, p. 89).
Nessa adaptação nomeada apenas de Orfeu, feita após quase 20 anos, os
morros foram retratados com domínio dos tracantes de drogas, um Brasil menos
colorido e a guerra entre policiais e bandidos. Sua versão se adaptou à época,
trazendo também o funk, o rap, buscando trazer a realidade contemporânea das
favelas cariocas que, àquela altura, fora dominada pelas facções. Também trouxe
a miscigenação, Orfeu era negro, Eurídice mestiça, lida como branca, o líder do
tráco também era um homem branco.
Em todos os aspectos ele vem para ser o oposto, o Orfeu de Camus tem
muitas cenas externas, o ambiente parece ter muita coletividade, e também a
estrutura das favelas eram diferentes. Em 40 anos o êxodo rural, migração de
pessoas de outros estados, especulação imobiliária, a favela do lme de Diegues
que foi construída em estúdio era um amontoado de casas e poderia representar
qualquer favela do Rio de Janeiro que aquele momento era um espaço
superlotado. Já era uma conjuntura mais individualista.
Diegues queria demonstrar questões políticas e sociais com sua versão e
o lme foi lançado em um momento de importância no cenário nacional, pois
no nal da década de 1990, o Brasil passava por um momento de retomada
cinematográca após uns anos de descaso estatal e preterimento do cinema
estrangeiro pelo público. Ele sabia das críticas que enfrentaria por retratar um
Orfeu com uma estética tão bruta, mas atrelou isso a fatores da época em que
os lmes foram lançados. Para Diegues, Camus fez uma representação para
estrangeiro ver, um lme colorido em 1959 chamava atenção, era um mundo
vivendo em meio a uma Guerra Fria.
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A questão posterior que se teve com essa necessidade de tentar retratar o
povo e sua realidade, é que o espectador vai ao cinema na função de se distrair,
então esses lmes acabaram por não conseguir o diálogo com a massa que eles
queriam. O morador do morro queria se ver na tela, mas nem sempre extrair uma
grande reexão do quão sua vida é brutal. Gostaria de apenas rir. Logo, lmes mais
densos, dramáticos, passaram a chamar atenção de festivais, de intelectuais e
acadêmicos. Mas também retomou a produção brasileira de um drama fundido
com a ação, posteriormente tivemos Cidade de Deus (dirigido por Kátia Lund;
Fernando Meirelles, 2002), Tropa de Elite 1 e 2 (dirigido por José Padilha, 2007;
2010).
O lme de Camus ainda hoje é mais lembrado. Talvez não somente pelo capital
estrangeiro e os prêmios, mas porque o cinema as vezes serve como válvula de
escape da dura realidade. Temos reexo disso ao ver que as maiores bilheterias
nacionais são comédias. A crítica, principalmente internacional na época do
lançamento reagiu negativamente ao lme de Diegues e que era ciente que
haveria comparações com o lme de Camus. Um lme de um amor trágico, mas
colorido havia se tornado um lme bruto e trágico. Apenas um drama. Talvez pelo
mito de brasileiro feliz ainda ser muito forte no exterior.
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