EDITORIAL  
REPARAÇÕES NECESSÁRIAS, ATUAÇÃO DO ESTADO E PROTAGONISMOS OUTROS –  
EDITORIAL  
NECESSARY REPAIRS, STATE ACTION AND OTHER PROTAGONISMS – EDITORIAL  
O trigésimo primeiro número de Albuquerque: revista de história é publi-  
cado em meio à escalada da violência em âmbito internacional, com o avanço  
dos confrontos relativos à invasão da Ucrânia pela Rússia a partir de fevereiro  
de 2022, e a violentíssima ofensiva militar de Israel contra a Palestina na faixa de  
Gaza, a partir de outubro de 2023. Israel tem sido acusado de limpeza étnica e  
de ações genocidas diuturnamente, mas o efeito prático das acusações parece  
longe de ocorrer, seja com o fim dos ataques, seja com a culpabilização em razão  
das ações.  
Os grupos/sujeitos/estados hegemônicos neste tabuleiro geopolítico rara-  
mente sofrem sanções efetivas, ou têm prejuízos significativos decorrentes de  
suas ações violentas. Apesar disso, é preciso que sejam denunciados, que as  
pessoas, instituições e movimentos sociais se coloquem contrariamente à ne-  
cropolítica transnacional que observamos neste momento.  
No Brasil, os dados sobre a violência contra a população negra, contra as  
mulheres, contra as pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis,  
intersexos, assexuais e demais pessoas com variabilidade de gênero ou de orien-  
tação sexual (lgbti+), contra os povos indígenas permanecem demonstrando o  
quanto os setores hegemônicos de nossa sociedade são violentos e o quanto Es-  
tado é lento e/ou pouco se mobiliza no enfrentamento da situação.  
Em 7 de agosto de 2024 o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Ro-  
berto Barroso, pediu desculpas, em nome do Poder Judiciário, a Maria da Penha,  
em razão da demora nos trâmites de seu caso de violência doméstica, tão em-  
blemático que ela empresta seu nome à lei nº 11. 340, de 7 de agosto de 2006, que  
criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar e que completou  
dezoito anos. O Monitor de Feminicídios no Brasil, iniciativa do Laboratório de Es-  
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tudos de Feminicídios da Universidade Estadual de Londrina, aponta para cres-  
cimento de números estaduais que chegam a cerca de 170% de 2023 para 2024.  
A Lei Maria da Penha permanece, portanto, tão relevante quanto o era quando de  
sua publicação.  
Aos 64 anos, Maria Luiza Silva, aposentada compulsoriamente vinte e dois  
anos atrás pela Aeronáutica ao se declarar uma mulher trans, recebeu sentença  
final do Superior Tribunal de Justiça, que reconheceu que ela foi vítima de  
discriminação e que deveria ser reparada por isso. As garantias de dignidade e de  
não discriminação às pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis,  
intersexos, assexuais e demais pessoas com variabilidade de gênero ou de  
orientação sexual (lgbti+) permanecem inexistentes, demoradas, inviáveis...  
Parte significativa desta população ainda carece de acesso efetivo aos benefícios  
do Estado e a uma existência plena.  
Em Douradina, Mato Grosso do Sul, os indígenas da Terra Indígena Panambi-  
Lagora Rica estão sofrendo ataques dos produtores rurais, conclamados por  
meio de fake news a agirem violentamente contra os indígenas. Mesmo com a  
força nacional presente na região, produtores e seus capangas não têm sido  
intimidados e a violência permanece: são mais de cinco séculos de genocídio  
dos povos indígenas, seja pelas pestes, pela bala, pelo epistemicídio realizado  
pelos missionários desde que os primeiros europeus puseram seus pés nestas  
plagas.  
A população negra continua sendo a que mais sofre com o racismo, seja por  
ataquesàsuacoletividadeouindividualmente,injúrias,mortesviolentas,inclusive  
aquelas causadas pelas polícias, o racismo religioso – inclusive aquele praticado  
por órgãos do Estado brasileiro, como a recente destruição de um terreiro de  
jarê no Parque Nacional da Chapada Diamantina por agentes do Instituto Chico  
Mendes de Conservação da Biodiversidade em 21 de julho deste ano.  
E, em meio a essas cenas de violência contra a população negra e contra  
as mulheres, são as mulheres negras as grandes protagonistas da participação  
brasileira nos Jogos Olímpicos Paris 2024: Beatriz Souza e Rebeca Andrade foram  
medalhistasdeouroemsuasmodalidades(judôeginásticaartística/solofeminino,  
respectivamente). Duas mulheres negras, empenhadas profissionalmente em  
suas atividades esportivas, conquistaram o lugar mais alto do pódio. Rebeca  
Andrade, conquistando outras medalhas ainda, tornou-se a maior medalhista  
brasileira da História das Olimpíadas. E outras mulheres e outros homens também  
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conquistaram medalhas de prata e bronze, demonstrando a importância de uma  
educação que contemple o esporte para o desenvolvimento do país.  
Há que se ressaltar que, onde antes prevaleceu a presença de pessoas  
brancas e de origem abastada, o protagonismo de mulheres negras, de origem  
empobrecida se fez. Que se faça!  
E que os artigos e resenhas publicados neste número de Albuquerque:  
revista de história, que trazem reflexões sobre quadrinhos da Marvel e da DC  
Comics, sobre raça, racismo e interseccionalidade, a democracia racial e a  
recepção de “Orfeu Negro”, o aquilombamento na cidade de São Paulo, sobre  
o ensino de gêneros multissemióticos, a Amazônia, a decolonialidade e suas  
tessituras pelos indígenas, os processos de subjetivação feminina e os arquivos  
pessoais de mulheres. No Caderno Especial, reflexões sobre Euclides da Cunha e  
Rita Lee exploram a República e as subversões do amor. Jéssica Ferreira Alves,  
Robson Pereira da Silva e Rafael Alves Pinto Júnior encerram o número com duas  
resenhas. Agradecemos a todas as autoras e todos os autores por contribuírem  
com Albuquerque: revista de história nos enviando seus textos. E esperamos que  
as leitoras e os leitores apreciem o que têm em mãos.  
Aguinaldo Rodrigues Gomes  
Miguel Rodrigues de Sousa Neto  
Editores.  
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