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A EMERGÊNCIA E DESENVOLVIMENTO DA JUSTIÇA TRANSICIONAL COMO CAMPO DE
PESQUISA E DE APLICAÇÃO PRÁTICA1
THE EMERGENCE AND DEVELOPMENT OF TRANSITIONAL JUSTICE AS A FIELD OF
RESEARCH AND PRACTICAL APPLICATION
Thomas Fischer2
https://orcid.org/0000-0003-1464-7561
Tradução de Rafael Morato Zanatto3
https://orcid.org/0000-0001-6623-4668
http://lattes.cnpq.br/0473516658198812
Recebido em: 13 de novembro de 2024.
Aprovado em: 12 de janeiro de 2025.
https://doi.org/10.46401/ardh.2024.v16.22637
1 Título original: Die Entstehung und Entwicklung von Transitional Justice als forschungs- und
anwendungspraktisches Feld. Tradução: Rafael Morato Zanatto.
2 Doutor em História pela Universidade de Berna. Professor da Universidade Católica de Eichstätt,
na Cátedra de História da América Latina. E-mail: th.fischer@ku.de
3 É graduado (2010), mestre (2013) e doutor (2018) em História pela Universidade Estadual Paulista
“Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) e realizou, com o amparo da FAPESP, estágios de pesquisa na
Cinémathèque Française (Paris, 2012) e na Deutsche Kinemathek (Berlim, 2017). E-mail: rafael_za-
natto@hotmail.com
RESUMO: O texto traz uma visão geral da
formação, da importância e da transformação da
Justiça Transicional, discutindo a aplicação prática
de justiça/direitos e verdade, através dos quais
sua localização em contextos históricos é realizada.
A partir do apontamento dos principais atores
e instituições do campo, é descrito a dimensão
acadêmica do campo da Justiça Transicional,
identificando as interfaces e demarcações dos
estudos sobre paz (Peace Studies) e pesquisas
sobre desenvolvimento (Development Studies). O
autor também faz um balanço dos estudos históricos
nesse campo. Por fim, são identificadas as áreas
problemáticas e é feito uma avaliação crítica. Isso
também levanta a questão de até que ponto a
Pesquisa Histórica sobre Paz e Conflitos (PHPC) e
Justiça Transicional podem trabalhar melhor em rede
e até que ponto a PHPC pode se beneficiar da Justiça
Transicional.
Palavras-chave: Justiça Transnacional,
pesquisas sobre desenvolvimento, Pesquisa
Histórica sobre Paz e Conflitos.
ABSTRACT: The text provides an overview
of the formation, importance and transformation
of Transitional Justice, discussing the practical
application of justice/rights and truth, through which
their location in historical contexts is achieved.
Based on the identification of the main actors and
institutions in the field, the academic dimension
of the field of Transitional Justice is described,
identifying the interfaces and demarcations of Peace
Studies and Development Studies. The author also
takes stock of historical studies in this field. Finally,
problematic areas are identified and a critical
assessment is made. It also raises the question of to
what extent Historical Peace and Conflict Research
(PCR) and Transitional Justice can better work
together and to what extent PCR can benefit from
Transitional Justice.
Key words: Transitional Justice, Peace
Studies, Development Studies.
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Desde que os processos de democratização ocorreram na maioria dos
estados latino-americanos na década de 1980 e, posteriormente, em muitos
estados africanos, do leste asiático e do leste europeu, especialistas, juristas e
decisores (as) políticos (as) se perguntaram sobre qual papel os passados violentos
desempenharam e deveriam desempenhar na implementação das transições
democráticas. Em sua opinião, a construção de um futuro sustentável dependia da
resposta a esta pergunta. Eles nomearam, analisaram e avaliaram as atrocidades
e fizeram recomendações sobre como lidar com elas. Nunca antes se tinha feito
tanto esforço político, jurídico e jornalístico em todo o mundo para superar os
crimes contra os direitos humanos. Em vista dos inúmeros processos judiciais,
comissões da verdade e outras medidas e do número crescente de projetos,
pesquisas e publicações sobre o assunto em todo o mundo, a historiadora russa
Nanci Adler fala de uma “Era de Justiça Transicional” (ADLER, 2018, p. 1). O conceito
“Justiça Transicional” (daqui em diante JT), que reúne medidas e abordagens da
política, da justiça e do meio acadêmico para lidar com o passado violento, foi
estabelecido em meados da década de 1990 e ainda está presente hoje. Um artigo
introdutório da Agência Federal Central para a Educação Política4 coloca desta
forma: “‘Lidar com o passado [Vergangenheitsarbeit]’ ou JT representa todas
as medidas destinadas a recuperar, reconhecer e punir as injustiças cometidas
durante a ditadura e a guerra” (ZUPAN, 2016). Deve-se acrescentar que a JT é
vista como um complemento e apoio às medidas institucionais e estruturais
no contexto dos processos de democratização. Ao se concentrar na violência
perpetrada contra as vítimas, os Estados (e a população) são responsabilizados
como beneficiários [Adressaten]. Os direitos humanos são o parâmetro para
avaliar os crimes. Ao lidar com o passado de forma sustentável, o presente deve
ser influenciado e uma contribuição deve ser feita para garantir que tais crimes
não ocorram novamente no futuro.
Embora existam muitas interfaces temáticas, conceituais e metodológicas,
a JT tem recebido pouca atenção dos (as) historiadores (as) em geral e da pesquisa
histórica sobre paz e conflitos em particular. Para muitos (as) historiadores (as),
isso pode ter algo a ver com a ação política e administrativa cientificamente
apoiada que é constitutiva da JT. Isso mudou desde então: Não apenas os (as)
historiadores (as) estão oferecendo cada vez mais seus conhecimentos no campo
4 Bundeszentrale für politische Bildung.
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da JT, como também seus conhecimentos especializados estão sendo cada vez
mais solicitados pela comunidade da JT no curso da expansão interdisciplinar.
Há uma necessidade de conhecimento histórico especializado no campo de
conhecimento da JT, particularmente nas áreas que lidam com crimes que
ocorreram há muito tempo (em “comissões de historiadores (as)”), a classificação
histórica de crimes violentos (por exemplo, em análises de época e periodizações),
a preservação de longo prazo de fontes em arquivos acessíveis ao público, cultura
histórica (especialmente museus), história pública e didática histórica. Na
Alemanha, essas atividades historiográficas ocorrem principalmente ao tratar
dos crimes nazistas, das violações dos direitos humanos da ditadura da RDA e
do colonialismo. Entretanto, os (as) historiadores (as) que veem as transições
como processos de longo prazo geralmente só intervêm quando as transições
no sentido mais restrito já foram concluídas há muito tempo. Então, quais são
as consequências do fato de as medidas praticadas nas fases de transição para
apoiar o processamento de crimes contra os direitos humanos serem resumidas
no termo JT? Como a JT pode ser caracterizada? E qual é o papel da
A seguir, apresentarei primeiro uma visão geral da formação, da importância
e da transformação da JT. Em seguida, discuto a aplicação prática dos
componentes de justiça da JT: justiça/direitos e verdade, através dos quais sua
localização em contextos históricos é realizada. Os principais atores e instituições
do campo são citados. Em seguida, descrevo a dimensão acadêmica do campo
da JT, identificando as interfaces e demarcações dos estudos sobre paz (Peace
Studies) e pesquisas sobre desenvolvimento (Development Studies). Em seguida,
dou uma olhada [werfe ich einen Blick] nos estudos históricos nesse campo. Por
fim, identifico as áreas problemáticas e faço uma avaliação crítica. Isso também
levanta a questão de até que ponto a Pesquisa Histórica sobre Paz e Conflitos
(PHPC) e JT podem trabalhar melhor em rede e até que ponto a PHPC pode se
beneficiar da JT.
O QUE É JUSTIÇA TRANSICIONAL? E O QUE ELA NÃO É?
O termo JT surgiu em meados da década de 1990 no contexto histórico
específico de “transições democráticas” que ocorreram em diversas regiões do
mundo nas décadas anteriores. Entre 1974 e 1990, mais de 30 países em todo
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o mundo fizeram uma transição de ditaduras militares e regimes autoritários,
bem como de estados devastados pela guerra civil, para sistemas de governo
democráticos liberais. Estas convulsões ocorreram no contexto de uma “imensa
concentração de iniciativas políticas de direitos humanos”, o que aumentou a
pressão mundial para ancorar permanentemente os direitos humanos na prática
política (ECKEL, 2015, p. 343). Os movimentos de democratização começaram
com o fim das ditaduras no sul da Europa (Portugal 1974, Grécia 1974, Espanha
1975/1976). Na América do Sul, os regimes autoritários entraram em colapso a
partir do final da década de 1970 (Equador 1979, Bolívia 1979/1982, Peru 1980,
Argentina 1983, Brasil 1985, Uruguai 1985, Paraguai 1989, Chile 1989/1990). Este
processo continuou na América Central, no México e no Caribe até boa parte
da década de 1990. Desde o início da década de 1980, os processos de reforma
democrática também surgiram na Europa Oriental, começando na Polônia,
depois na Hungria e – com Mikhail Gorbachev como Presidente da União Soviética
– também nas outras partes do Bloco Oriental. A RDA e os Balcãs também foram
afetados por este processo. A década de 1990 assistiu a transições democráticas
no continente africano, na Ásia e, finalmente, no Oriente Médio. Neste contexto, o
influente cientista político americano Samuel Huntington, que leciona e pesquisa
na Universidade de Harvard, no seu livro A Terceira Onda – Democratização no Final
do Século XX5 (HUNTINGTON, 1991, p. 16), publicado em 1991 e que rapidamente
ganhou notoriedade ao reconhecer uma “onda de democratização” globalmente
eficaz. Na sua opinião, estes processos de transição foram precedidos por duas
“ondas” semelhantes, as de 1828 a 1926 e de 1943 a 1962.
De acordo com o especialista em África Ocidental Dustin N. Sharp, da Escola
Kroc de Estudos da Paz da Universidade de San Diego (SHARP, 2015, p. 150), a
justiça transicional não emergiu como uma abordagem independente, mas,
com algum atraso, como serva [handmaiden] da investigação de transição já
estabelecida.
O momento inicial do vocabulário da JT foi, sem dúvida, a publicação em
1995 da coleção de três volumes Justiça Transicional. Como as Democracias
Emergentes se reconciliam com os Antigos Regimes6. Ela foi financiada pelo
governo e desenvolvida em Washington D.C. pelo Instituto para a Paz dos EUA
5 The Third Wave - Democratization in the Late Twentieth Century.
6 Transitional Justice. How Emerging Democracies Reckon with Former Regimes.
TRADUÇÃO
324 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
(USIP)7, especializado em aconselhamento político responsável; O advogado
e consultor político Neil Kritz atuou como editor dos 224 textos principais
publicados. Richard H. Solomon, presidente da USIP, expressou no prefácio a
esperança de que a publicação em três volumes se tornasse “uma referência
padrão para governos, organizações privadas, pesquisadores e outros indivíduos
preocupados com este assunto difícil” (SOLOMON, 1995, XV). No seu prefácio, o
presidente sul-africano Nelson Mandela expressou desejos semelhantes; ele viu
a coleção como “um incentivo para estabelecer uma comunidade internacional
dedicada à dignidade humana e à justiça” (MANDELA, 1995, p. XI). Como figura
principal numa transição pacífica no Sul Global, Mandela deu à publicação o
capital simbólico necessário para a percepção pública. Contudo, o trabalho não
forneceu uma descrição exata do que se entendia por JT. Na introdução, intitulada
Os dilemas da Justiça Transicional8, Kritz levantou principalmente questões
e evitou uma definição da JT (KRITZ, 1995, p. XIX – XXX). Com base em suas
descrições de casos relacionados a problemas da história e do (então) presente,
pode-se pelo menos deduzir que ele considerava o tratamento de crimes contra
os direitos humanos cometidos em ditaduras e guerras civis como constitutivos
da transição para democracias estáveis e sociedades liberais. Além disso, Kritz
considerava importante a visão geral global das graves violações dos direitos
humanos. Portanto, esse tópico também foi abordado pelas contribuições que
se seguiram à sua introdução, a partir de perspectivas de diferentes áreas.
A publicação foi precedida por conferências maiores e menores,
principalmente internacionais. Nestes congressos participaram políticos
renomados, altos funcionários e um núcleo semelhante de cientistas, a maioria
deles advogados e cientistas políticos. Os marcos foram a conferência Crimes de
Estado: Punição ou Perdão?9, com foco na América Latina, organizada em 1988
pelo think tank não comercial Instituto Aspen10 em Maryland. Ela foi sucedida
em 1992 pela conferência Justiça em Tempos de Transição11 sobre a Europa
Oriental, em Salzburg (Áustria), patrocinada pela Open Society Foundation de
George Soros, que posteriormente estabeleceu uma espécie de mito fundador
7 United States Institute of Peace – USIP.
8 The Dilemmas of Transitional Justice.
9 State Crimes: Punishment or Pardon?
10 Aspen Institute.
11 Justice in Time of Transition.
TRADUÇÃO
325 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
da comunidade da JT. Dois anos depois, as conferências realizadas na Cidade
do Cabo (África do Sul) tiveram um propósito semelhante. Lá, os especialistas
discutiram e sistematizaram diversas experiências e estratégias, bem como o
papel do direito e da justiça com vista às transições em curso e futuras na África
(ZUNINO, 2019, p. 183; MOURALIS, 2014, p. 90-93).
Como afirma a socióloga Anne Krüger em seu panorama para o público
de língua alemã interessado em história contemporânea, a publicação de Kritz
estabeleceu o JT como “um novo objeto de investigação”. A JT tornou-se um
“conceito independente que desenvolveu um ponto de referência para pesquisa
e prática” (KRÜGER, 2013, p. 4). Krüger defende, portanto, uma compreensão
histórico-conceitual da JT. De acordo com Paige Arthur, especialista em
consolidação da paz do Centro Internacional de Justiça Transicional12 (ICTJ) de
Nova Iorque, o surgimento, a consolidação e a mudança da JT podem ser melhor
reconstruídos com uma abordagem histórica conceitual (ARTHUR, 2009, p. 321-
367).
Então, o que é JT se não for um conceito analítico e não for possível
estabelecer uma definição precisa do instrumental da JT? O historiador
Guillaume Mouralis entende que este é um termo com uma função tática. Para
ele, a JT é uma palavra introduzida como uma marca no mercado acadêmico e
político. Segundo Mouralis, a coleção de Kritz é uma prova de como um objeto
relativamente heterogêneo pode ser promovido através da criação de uma marca
unificadora e, assim, resumido de uma nova maneira (MOURALIS, 2014, p. 85; 96).
Mas é claro que TJ é mais do que apenas uma marca de marketing. Há amplo
consenso de que se trata de um campo independente (diferenciado de outros
espaços de conhecimento) com atores que assumem, defendem e desenvolvem
posições (BOURDIEU, 1996; LENGER; RHEIN, 2018, p. 71-117). O advogado Marcos
Zunino (2019) pesquisa o surgimento desse campo com uma análise do espaço
discursivo considerando os objetos da JT e o participante do discurso. Segundo
o advogado argentino, o que é característico do campo da JT é a sua abertura
a novos desenvolvimentos com base empírica, relacionados ao contexto e
refletidos academicamente. Ele também é multi ou interdisciplinar. Por fim, tem
uma dimensão prática e uma dimensão acadêmica.
Os atores que definiram os pilares do emergente campo da JT queriam
12 International Center for Transitional Justice.
TRADUÇÃO
326 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
aproveitar a oportunidade. Já na conferência de decisores políticos, altos
funcionários governamentais e economistas dos EUA e da América Latina,
organizada pelo Instituto Peterson de Economia Internacional13 e realizada em
Washington em 1989, foi alcançada uma espécie de consenso sobre a reorganização
econômica (MARANGOS, 2009, p. 350-384). Este “ajuste” com medidas definidas
para áreas individuais da economia na América Latina foi chamado de Consenso
de Washington. Os adeptos do liberalismo também esperavam soluções baseadas
no consenso a nível político. O que uniu os apoiantes da JT foi – comparável ao
Consenso de Washington – a convicção de que estavam num ponto de viragem
na história mundial e de que estavam entrando numa era uniforme, econômica
e politicamente liberal. O ponto de referência narrativo para esta crença foram
as teses do cientista político Francis Fukuyama, da Universidade de Stanford,
que ele formulou em seu sensacional ensaio O Fim da História?14 (1989). Para a
primeira geração da JT, O Fim da História foi uma espécie de manifesto. Para eles,
o liberalismo significava o destino final da humanidade, a história do progresso
no Ocidente deveria ser encerrada como um destino universal após o fim da
Guerra Fria. Para que essa etapa final em direção à realização fosse concluída, a
janela de oportunidade que se abriu poderia, na verdade deveria, ser ativamente
apoiada.
O direito e a ciência política desempenharam um papel importante no
surgimento do campo da JT. Gradualmente, porém, outras disciplinas foram
acrescentadas, como a etnologia e a antropologia e a sociologia. Como já foi
indicado, este espaço de conhecimento teve inicialmente os seus centros de
gravidade acadêmicos nos EUA – uma grande proporção dos participantes veio
deste país e novos membros foram continuamente qualificados lá – mas cada vez
mais participantes (e cada vez mais participantes do sexo feminino) juntaram-se
a partir de outras partes do mundo, de modo que o campo adquiriu cada vez mais
uma dimensão transnacional – embora com porta-vozes acadêmicos dos EUA e
algumas porta-vozes femininas. A lingua franca da comunidade permaneceu o
inglês; O espanhol, o português e o francês logo foram utilizados, especialmente
na América Latina e na África. O campo da JT estava próximo da política, “emergiu
diretamente de uma série de interações entre ativistas, advogados e juristas,
13 Peterson Institute for International Economics.
14 The End of History?
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políticos, jornalistas e especialistas em política comparada preocupados com
os direitos humanos e com as ‘transições para a democracia’” (ARTHUR, 2009, p.
324). Desde 1997, as unidades das Nações Unidas que lidaram com o papel dos
passados violentos nas convulsões democráticas também adotaram o nome JT.
Como enfatizam Anne Krüger e o historiador Stephan Scheuzger (2007, p.
143) a rede cada vez mais densa promoveu a sistematização, generalização e
padronização do conhecimento da JT, o que facilitou a transferência de lições
aprendidas, boas práticas e diretrizes em todo o mundo. Embora esta observação
sobre a comunidade da JT seja indubitavelmente verdadeira, não creio que deva
ser superestimada. Independentemente das tendências de homogeneização
observadas por Krüger e Scheuzger (2007), as práticas da JT na realidade diferem
significativamente das especificações do modelo devido a condições contextuais
locais divergentes.
VERDADE
As medidas recomendadas e/ou efetivamente tomadas pelos peritos em
JT focam-se nomeadamente em dois aspectos centrais: a verdade e a justiça/
direito. Estes objetivos devem ser alcançados, em particular, através de medidas
de punição, restituição, reparações, descoberta da verdade e reforma das
instituições (as forças de segurança e o poder judicial) (ARTHUR, 2009, p. 321-
367; ROHT-ARRIAZZA; MARIEZCURRENA, 2006, p. 2). O fato de essas (e não outras
medidas e instrumentos) terem prioridade na estrutura da JT se deve ao paradigma
da transição liberal-democrática e da paz, às tradições caracterizadas pelos
direitos humanos e criminais, bem como à natureza conceitual e institucional do
campo (WALDORF, 2012, p. 173).
No entanto, as medidas aplicadas em casos individuais variaram dependendo
da constelação de transição. As transições de décadas em Espanha e no Chile,
por exemplo, foram o resultado de negociações entre velhas e novas elites.
O fato de grupos de liderança militares e civis, ou seja, os perpetradores e os
seus apoiantes, terem sido incluídos nas negociações de transição decorreu
da manutenção do seu poder. Conseguiram colocar sob pressão governos civis
eleitos democraticamente e extrair-lhes concessões significativas (ROHT-
ARRIAZZA; MARIEZCURRENA, 2006, p. 2). Essas concessões também foram
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feitas na Argentina, onde a quarta junta militar teve de abdicar após a Guerra
das Malvinas. Raúl Alfonsín (1983–1989), o primeiro presidente eleito após a
ditadura, manifestou-se a favor da investigação legal das violações dos direitos
humanos cometidas durante a ditadura. Mas depois de 1986, o Congresso aprovou
disposições de anistia de longo alcance para os perpetradores. Só em 2005 é que
os julgamentos criminais recomeçaram e os indultos concedidos pelo Presidente
Carlos Saúl Meném (1989–1999) foram retirados. No Uruguai, ambas as câmaras
do parlamento também aprovaram uma lei de anistia em 1986; Em 1989, a mesma
foi confirmada por um referendo (FUCHS, 2010, p. 81-298). Mesmo nos países
em guerra civil, como Guatemala, El Salvador e Nicarágua, os perpetradores da
violência dificilmente foram responsabilizados pelas atrocidades pelas quais
foram responsáveis. Além disso, um processo criminal abrangente por parte do
poder judiciário nacional teria sobrecarregado em muito o reestruturado sistema
jurídico.
Nos estados de transição, nos quais continuava a existir o exercício do
poder pelas elites civis-militares responsáveis pelos crimes, os decisores
democraticamente legitimados encontravam-se geralmente num conflito entre
o que Max Weber chamou de comportamento ético de responsabilidade e o
comportamento ético de condenações (NOLTE, 2000, p. 291-310). Os governos
e as instituições dos estados redemocratizados que realizaram apenas uma JT
leve, ou seja, nenhum processo minucioso contra os perpetradores, geralmente
se justificaram dizendo que seu escopo de ação era limitado em vista do poder
contínuo dos criminosos. A punição abrangente dos perpetradores é, portanto,
secundária em relação ao objetivo global de democratização e estabilidade.
Simplesmente ofereceram às vítimas a reconstituição da verdade. M. Cherif
Bassiouni, um dos principais especialistas mundiais em direito penal internacional
e fundador do Instituto Internacional de Direito dos Direitos Humanos15 em
Chicago em 1990, questionou essa abordagem. Lamentou que, apesar do elevado
nível de vitimização nas ditaduras e nas guerras desde a Segunda Guerra Mundial,
e mesmo nas violações do Jus Cogens, como o genocídio, os crimes contra a
humanidade, os crimes de guerra e a tortura, a ação penal contra os infratores
quase nunca é levada a cabo de forma exaustiva, tanto a nível nacional como
internacional. Se apenas a reconstituição da verdade ou nenhuma JT ocorrer,
15 International Human Rights-Law-Institute
TRADUÇÃO
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parece que “a justiça [...] está sendo trocada por acordos políticos” (BASSIOUNI,
1996, p. 11). Na verdade, até ao início da década de 1990, quase não existiam
estados de transição em que ambos os instrumentos para lidar com o passado
fossem utilizados de forma igual. Sim, a justiça legal tem sido frequentemente
deixada de lado devido ao poder contínuo dos perpetradores e dos seus apoiantes.
Na América Latina, em particular, a maioria dos estados criou comissões da
verdade como parte dos processos de transição. A Comissão Nacional sobre o
Desaparecimento de Pessoas16 (CONADEP, 1983-1984) argentina, que, como o
próprio nome sugere, se preocupava principalmente com os desaparecimentos
de pessoas durante a ditadura, serviu de modelo para as comissões chilenas e
sul-africanas subsequentes; Estas, por sua vez, transferiram as conclusões para
outras comissões (ENGEL, 2017, p. 363).17 A “verdade”, juntamente com a “justiça/
lei”, a exigência central dos direitos humanos e das organizações de vítimas,
tornou-se agora cada vez mais um postulado inegociável nos processos de
transição entre o crescente grupo de especialistas mais próximos da política e
de redes transnacionais.
A Comissão Argentina, como todas as subsequentes, surgiu devido a
necessidades locais. Até então, não havia teoria e/ou conceito sobre os benefícios,
o projeto e o impacto das comissões da verdade. Os membros da comissão não
tinham nenhum modelo a seguir.18 Como mostra o estudo da autora e ativista
Priscilla B. Hayner (2001), especializada em crimes contra os direitos humanos
e comissões da verdade, as comissões da verdade criadas nos anos seguintes
diferiram consideravelmente devido as exigências locais e condições iniciais
divergentes no que diz respeito à legitimação política, à estrutura institucional,
ao financiamento, ao mandato, à composição da comissão, aos métodos de
trabalho e à duração do mandato. No entanto, as seguintes semelhanças podem
ser mencionadas:
Em contraste com os julgamentos judiciais, as comissões da verdade não
“punem” os (as) perpetradores (as) através da privação de liberdade, mas sim
documentando e publicitando os seus crimes violentos. Ao mesmo tempo,
16 Comisión Nacional sobre la Desaparición de Personas.
17 Anne K. Krüger deu uma visão geral das comissões da verdade entre 1974 e 2011 no livro Comis-
sões da verdade. A disseminação global de um modelo cultural (2014).
18 As origens, a justificativa, o estabelecimento e o desenvolvimento do método dessa comissão
ainda são pouco pesquisados.
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pretendem reconhecer a violência sofrida pelas vítimas e tomar medidas para
restaurar a sua dignidade. Ao reconstruir e dizer a “verdade”, elas se concentram
nas vítimas prejudicadas e nos seus ferimentos físicos, emocionais e materiais.
As comissões da verdade não se dirigem apenas às vítimas e aos perpetradores
(quase sempre são homens), mas também tentam utilizar o seu relatório para
influenciar o nível de percepção e sensibilização de toda a população. Os relatos
da verdade são frequentemente precedidos por uma interpretação histórica
oficial. Explica à população porque é que o conflito se intensificou e, como
resultado, ocorreram os crimes violentos, que dimensões assumiram e quem
foram os perpetradores e quem foram as vítimas. Desta forma, invalidam a
interpretação dos (as) perpetradores (as), que é reforçada através da violência
(censura, perseguição de jornalistas críticos), e fortalecem a perspectiva
reprimida das vítimas; Expandir o espaço de possibilidade das vítimas através
do estabelecimento de narrativas alternativas é um pré-requisito importante
para as tentativas de superar traumas individuais e coletivos e de recuperar a
confiança das pessoas afetadas, a fim de moldarem conjuntamente o futuro e os
processos posteriores de reconciliação.
O trabalho das comissões da verdade é democraticamente legítimo
porque são nomeadas por governos eleitos.19 Os seus relatórios finais devem
ser recebidos e divulgados pelos governos eleitos e as recomendações neles
formuladas devem ser implementadas para proporcionar reparação material
às vítimas e prevenir futuras violações. As comissões da verdade procuram
testemunhas (e perpetradores) e classificam os crimes. Embora apenas parte
do material recolhido seja disponibilizada ao público, a documentação tem como
objetivo garantir que a verdade sobre o ocorrido não possa ser manipulada ou
esquecida no futuro. Para além de outras medidas como a criação de memoriais, a
nomeação de locais e ruas ou a abertura de exposições em museus, as comissões
da verdade são locais com os quais se pretende uma “transição” sustentável da
memória coletiva. São – na terminologia da JT – um componente central para a
restauração da ordem, que é entendida como justa (justiça restaurativa). Deverão
contribuir para garantir que os crimes do passado não se repitam no futuro
(KRÜGER, 2014; HAYNER, 2001; FISCHER, 2000; FISCHER, 2022).
19 Contudo, como mostra a cientista social Fatima Kastner, utilizando o exemplo marroquino, a
influência externa é muitas vezes significativa e pode haver um forte envolvimento internacional
(KASTNER, 2015, p. 306-314).
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As comissões da verdade são compostas predominantemente por
advogados, cientistas políticos e, por vezes, antropólogos (as) ou etnólogos (as).
Idealmente, estes vêm de dentro do país. Em estados particularmente fracos
com uma população polarizada ou até mesmo fragmentada, como El Salvador ou
Guatemala, também foram nomeados membros estrangeiros para a comissão.
Para que os relatórios da verdade tenham impacto em uma grande parte da
população, especialmente em sociedades fragmentadas, é ainda mais importante
que pelo menos os membros da comissão possam concordar com um relatório
que seja apoiado por todos. A historiadora Nina Schneider vê, portanto, os relatos
da verdade como uma “‘narrativa de consenso’ dos membros da comissão, que
estão comprometidos com outros objetivos que não o esclarecimento científico,
histórico-factual (traçar o perfil do governo ou de si mesmo, estabilidade política,
reabilitação das vítimas, reconhecimento internacional)” (SCHNEIDER, 2017, p.
110).
Em alguns países de antigas ditaduras ou de guerra civil, ainda não foi
criada uma comissão da verdade. No que diz respeito ao antigo Bloco de Leste,
Krüger afirmou: “que na maioria dos casos nem as comissões da verdade nem os
processos criminais foram realizados sistematicamente” (KRÜGER, 2014, p. 9).
A antologia Justiça Transicional e a antiga União Soviética: revendo o passado,
olhando para o futuro20, editada pelas cientistas políticas Cynthia M. Horne e
Lavinia Stan, confirma esta conclusão (HORNE; STAN, 2018). O acesso aos arquivos
é praticamente mais difícil em qualquer lugar, especialmente os dos aparelhos
de vigilância, das forças de segurança e dos campos de prisioneiros. Apenas na
Alemanha reunificada os crimes contra os direitos humanos cometidos na antiga
RDA, especialmente as atividades do Ministério da Segurança do Estado (“Stasi”)
e as ordens dos guardas de fronteira para disparar, foram sistematicamente
examinados (DOSSIER STASI, 2018). A situação é também muito difícil nos Estados
sucessores da antiga Iugoslávia. Um projeto transnacional da sociedade civil, a
“Comissão Regional para Estabelecer os Fatos sobre Crimes de Guerra e Outros
Crimes Graves contra os Direitos Humanos no Território da Antiga Iugoslávia”
(REKOM) assumiu as rédeas porque os decisores nacionalistas nos estados
sucessores não queriam concordar com uma cooperação estreita (NIEßER,
2020).
20 Transitional Justice and the Former Soviet Union: Reviewing the Past, Looking the Future.
TRADUÇÃO
332 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
JUSTIÇA/DIREITO
Direito/justiça é a segunda grande preocupação da JT. Para garantir uma
coexistência pacífica sustentável em sociedades pós-conflito, não se trata
apenas de reconstituir a verdade sobre crimes graves de forma tão abrangente
quanto possível (justiça restaurativa), mas também de lidar judicialmente com
passados violentos e punir os perpetradores (justiça retributiva).21 Na virada do
milênio, a acusação criminal dos perpetradores aumentou significativamente, o
que, segundo a especialista internacional e em direitos humanos Ruti G. Teitel,
deveu-se à internacionalização (TEITEL, 2003, p. 89).
Para garantir que os perpetradores não fiquem impunes em situações difíceis
de transição interna, a comunidade internacional criou tribunais penais em Haia
para a ex-Iugoslávia (Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia, TPII, 1993)
e para Ruanda (Tribunal Penal Internacional para Ruanda, TPIR, 1994). Em vista
da violência flagrante em ambos os casos, que era visível para o mundo inteiro,
esses tribunais se concentraram no julgamento e na condenação dos autores
dos crimes mais graves contra os direitos humanos; a soberania nacional, que já
era precária nesses países que haviam entrado em guerra civil, pôde, portanto,
ser ignorada (KRÜGER, 2014, p. 8; ROHT-ARRIAZZA; MARIEZCURRENA, 2006,
p. 6; BASSIOUNI, 1996, p. 11)22. Argumenta-se frequentemente que os tribunais
internacionais mencionados são complicados, lentos, imperfeitos no seu trabalho
e pouco convincentes em termos do seu efeito dissuasor. Contudo, o exemplo do
TPII mostra que as críticas fundamentais são descabidas. Afinal, o Tribunal Penal
da ex-Iugoslávia emitiu 161 acusações até ao final da sua atividade em 2017; 84
réus foram finalmente condenados. O julgamento contra Slobodan Milošević foi
único na história jurídica recente; o antigo presidente sérvio (e Iugoslavo) morreu
sob custódia em 2006, pouco antes do final do seu julgamento.
O TPII e o TPIR não só trataram de crimes graves, mas também iniciaram
reformas de grande alcance no que diz respeito à aplicação do direito humanitário
internacional em nível interno. São também considerados os precursores do
21 Outro componente do TJ é a justiça reparativa, que não é discutida aqui, nem a lustração (remoção
de funcionários acusados de crimes contra direitos humanos). (WEIFFEN, 2017, p. 87-90).
22 Em Ruanda, também havia tribunais Gacaca na mesma época (prática jurídica comunitária lide-
rada pelos anciãos da aldeia).
TRADUÇÃO
333 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
Tribunal Penal Internacional de Haia (TPI), que está em funcionamento desde
2002. Esta é a autoridade mais visível da comunidade internacional e investiga
crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídio quando os tribunais
nacionais não podem ou querem (PENSKY, 2006). Desde 2018, o TPI também
exerce jurisdição sobre o “crime de agressão”, com base no qual estão envolvidos
membros de famílias políticas e militares. As elites de liderança de um estado
podem ser responsabilizadas pela agressão militar contra outro estado.
Pode-se dizer que nos últimos anos o direito e a prática jurídica se
desenvolveram no sentido de uma obrigação de punir, ainda que sob a
denominação da JT (MACULAN; GIL, 2020, p. 134). A execução de processos
judiciais contra os perpetradores, o que era impensável há três décadas, tornou-
se agora um direito (GREIFF; DUTHIE, 2020, p. 252). No entanto, isso não pode
ser implementado em qualquer momento e em qualquer lugar porque nem todos
os países ainda assinaram o estatuto. Ausentes importantes são a China, a Coreia
do Norte, a Índia, o Paquistão, a Turquia, o Irã e Cuba, que colocam a soberania
nacional acima das opiniões da comunidade internacional, incluindo questões de
direitos humanos. Esses estados têm resistido repetidamente e com sucesso à
democratização. Mas os EUA e Israel também se recusaram a ratificá-lo até hoje,
o que reduz significativamente o alcance da ação penal internacional. Assim,
embora a acusação criminal de crimes graves tenha tido alguns sucessos, o
balanço a nível mundial é pouco entusiasmante.
O que a punição de criminosos por tribunais criminais pode realmente
alcançar em termos de processos de democratização? Com relação ao impacto
social das medidas punitivas internacionais na antiga Iugoslávia, Janine Natalya
Clark chega a uma conclusão que deixa pouco espaço para otimismo (CLARK,
2014). Na percepção subjetiva de muitas pessoas, a condenação dos responsáveis
por crimes não é vista como um meio adequado para alcançar a justiça. Em
sociedades divididas, este instrumento de JT traz poucos benefícios para a
coexistência pacífica sem outras medidas de acompanhamento. A situação será
provavelmente semelhante em muitos países africanos e do antigo Bloco de Leste.
Pelo menos é assim que se podem interpretar os estudos de caso da antologia O
impacto dos processos judiciais de direitos humanos: Insights de sociedades pós-
TRADUÇÃO
334 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
conflito europeias, latino-americanas e africanas (2020)23, editada pela cientista
política Rosario Figari Layús e pelo especialista em memória coletiva Ulrike
Capdepón.
Contudo, se olharmos para as vítimas, pode-se traçar um quadro diferente:
recorrendo à Argentina, Figari Layús mostra que a acusação por tribunais
nacionais confirma a capacidade das vítimas de exigir e exercer os seus
direitos civis (LAYÚS, 2019, p. 4); as medidas legais tiveram, portanto, um efeito
fortalecedor sobre eles. Outro estudo apresentado por Eva van Roekel utiliza
uma abordagem fenomenológico-antropológica para mostrar como feridas não
curadas foram reabertas na Argentina após a retomada dos julgamentos por
crimes contra os direitos humanos, e quão emocionantes são os “sentimentos
relacionados ao passado” para todos os envolvidos (ROEKEL, 2020). A holandesa
sublinha que é difícil para as vítimas que estão na vanguarda das políticas e
medidas da JT (re)conquistarem justiça e dignidade, especialmente porque
os próprios procedimentos dão sempre aos responsáveis pelos crimes a
oportunidade de se retratarem e de apresentarem o seu ponto de vista. Por fim,
devem ser apontadas falhas na persecução criminal. Uma antologia publicada
por Laura García Martín, especializada em direitos humanos, documenta de
forma convincente que as empresas que se beneficiaram e apoiaram regimes
autoritários violaram massivamente os direitos humanos sociais; no entanto,
este aspecto não foi sistematicamente abordado (MARTÍN, 2020).
Não são apenas os difíceis contextos nacionais, as persistentes linhas
divisórias no seio das sociedades e o poder ininterrupto dos atores violentos que
impedem a aplicação duradoura das medidas da JT. O problema, afirma o sociólogo
Mikkel Jarle Christensen, também está enraizado na própria JT (CHRISTENSEN,
2020, p. 464-482). Seu estudo revela que as comissões da verdade e o sistema
de justiça criminal não estão suficientemente sincronizados nas suas ações. O
fato de os agentes reunidos no campo da JT terem uma formação disciplinar
por vezes heterogênea e, por conseguinte, trabalharem de forma diferente na
investigação e na prática não é uma constatação nova para quem trabalha nesse
campo. No entanto, o estudo de Christensen deve ser levado a sério como um
apelo a uma maior aproximação da prática do direito penal da TJ, que é percebida
23 The Impact of Human Rights Prosecutions: Insights from European, Latin American and African
Post-Conflict Societies (2020).
TRADUÇÃO
335 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
como hermética, com a das comissões da verdade e outras medidas de justiça
restaurativa, no sentido de uma reconciliação integrada com o passado.
JUSTIÇA TRANSICIONAL COMO CIÊNCIA
Apesar de reservas de longa data, particularmente no domínio da história,
o termo JT estabeleceu-se no discurso público e na maioria das disciplinas
acadêmicas desde a virada do milênio como uma denominação interdisciplinar
para a análise do passado em Estados em vias de democratização com um
passado ditatorial ou de guerra civil. Neste processo, formou-se uma área de
conhecimento independente sob a designação de JT, que podia ser distinguida
de outros campos acadêmicos e estabelecer prioridades em termos de conteúdo,
método, espaço e tempo.
Desde o início, muitos dos atores que trabalham sob a designação da JT
afirmaram abordar o seu tema de uma perspectiva científica (ROHT-ARRIAZZA;
MARIEZCURRENA, 2006, p. 1). Por outro lado, os conhecimentos práticos
adquiridos contribuíram gradativamente com a pesquisa acadêmica de base. Isso
permitiu que a comunidade em rápido crescimento expandisse e desenvolvesse
o campo, cooptasse os conhecimentos de outras disciplinas e o defendesse
contra a concorrência potencial de outros campos. Isso também melhorou sua
reputação entre colegas de outras áreas e lhes deu acesso a financiamento de
pesquisa e contratos lucrativos de consultoria.
No início da pesquisa em JT, os especialistas envolvidos eram principalmente
formados em universidades “ocidentais” com conhecimentos gerais de ciência
política e direito, mas nas últimas duas décadas, a comunidade quase sempre
exigiu competências na área para além deste conhecimento básico. Isso significa
que os contextos regionais e locais são levados mais a sério do que nos primeiros
tempos da JT. Este fato não só aumentou os conhecimentos especializados dos
pesquisadores do Sul Global, como também as abordagens de investigação se
tornaram mais interdisciplinares. Foram acrescentados estudos etnológicos,
antropológicos e de ciências sociais, particularmente no campo das comissões
da verdade.
É algo surpreendente que o campo acadêmico da JT se tenha estabelecido
como um espaço de conhecimento independente e não dentro de áreas de
TRADUÇÃO
336 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
investigação existentes, relacionadas com políticas, com competências na
mudança de sociedades em conflito, tais como estudos sobre paz e conflitos ou
a investigação para o desenvolvimento. Uma razão para isso pode ter sido o fato
de que os dois campos mencionados estavam preocupados consigo mesmos na
década de 1990: a investigação sobre a paz e os conflitos, que se preocupava
fortemente com as principais questões internacionais e interestatais durante a
Guerra Fria, sofreu uma mudança de perspectiva diante dos numerosos conflitos
internos que vieram à tona; nesse ajustamento, reconciliar-se com o passado não
foi a primeira prioridade. Em igual medida, a investigação para o desenvolvimento
também teve de se reinventar na ausência de sucessos convincentes. As reformas
socioeconômicas de cima para baixo derivadas de “grandes teorias” geralmente
caíram numa grande crise, de modo que os “grandes” projetos e narrativas
mestras foram abandonados (MENZEL, 1992). Após o fim do conflito Leste-Oeste,
o conflito Norte-Sul, que de forma alguma tinha sido superado, veio à tona. As
críticas pós-coloniais responderam aos poderosos ensinamentos do Norte
Global, especialmente dos principais institutos dos EUA. O livro Encontrando o
Desenvolvimento: A construção e a desconstrução do Terceiro Mundo (1995), de
Arturo Escobar, por exemplo, formulou um duro acerto de contas com o discurso
hegemônico do desenvolvimento. As reservas do antropólogo colombiano-
americano sobre a abordagem eurocêntrica e científica do mundo não europeu
poderiam facilmente ter sido aplicadas ao discurso inicial da JT.
De acordo com Anne K. Krüger, a pesquisa de JT desenvolveu-se em três
direções desde a década de 1990: Um primeiro conjunto de investigações
consiste em estudos de caso de determinados países, nos quais são examinadas
a história/causas, formas e curso da violência, as medidas da JT e seu impacto.
Um segundo grupo foca-se em medidas individuais, como as comissões da
verdade, que são geralmente examinadas comparativamente para identificar
analogias e diferenças. Uma terceira direção trata das condições de base a fim
de tirar conclusões sobre as medidas “corretas” (KRÜGER, 2014, p. 15; ANM; p. 70-
72).
O processo de estabelecimento da pesquisa em JT avançou através da criação
de institutos, cátedras e cátedras individuais, bem como da implementação de
congressos especializados, painéis em congressos disciplinares, workshops
e escolas de verão. Periódicos nas áreas de direito internacional, direito penal,
direitos humanos, pesquisa sobre paz e conflitos e estudos de desenvolvimento
TRADUÇÃO
337 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
também se abriram para o tema da JT.
Um marco no processo de institucionalização acadêmica foi a fundação
do Centro Internacional para Justiça Transicional24 (ICTJ) em 2001. Ele tenta
combinar conhecimentos empíricos e acadêmicos como nenhuma outra
instituição da JT. Ao mesmo tempo, os responsáveis estão se esforçando para
equilibrar o conhecimento local com o conhecimento global; por outro lado,
o conhecimento global deve ser transferido para o nível local. A organização
internacional sem fins lucrativos apoia Estados, decisores (as) e vítimas de
crimes nas transições democráticas e promove projetos de investigação em JT.
A investigação refere-se a estudos nacionais e estudos temáticos nas seguintes
áreas: Desarmamento, Desmobilização e Reintegração; Gênero e Reparações;
Identidades em Transição; Divulgação; Reparações; Justiça Transicional e
Desenvolvimento; Justiça Transicional e Deslocamento; Justiça Transicional,
Cultura e Sociedade; Verificação25. Entre outras coisas, os membros fundadores
se conheciam por seu trabalho na Comissão da Verdade da África do Sul. Muitos
rostos conhecidos da comunidade de JT fazem parte da diretoria e do conselho
consultivo.26 Institutos adicionais, como o Instituto Transicional da Universidade
de Ulster (THI)27, em 2003, seguiram o ICTJ.
Outro alicerce no estabelecimento da JJ foi a fundação da Revista
Internacional para Justiça Transicional28 na Universidade de Oxford em 2007 (OUP
Academic 2021). O conselho editorial e o conselho consultivo científico incluem
guardiões da comunidade que estabelecem padrões, definem agendas e garantem
a implementação de um vocabulário comum (https://www.ictj.org/about/board).
A série Estudos Routledge em Paz e em Resolução de Conflitos29, publicada pelo
Departamento de Estudos para a Paz da Universidade de Bradford30 desempenha,
desde 2006, um papel semelhante na publicação de monografias e antologias.
24 International Center for Transitional Justice.
25 https://www.ictj.org/research
26 International Center for Transitional Justice 2011; https://www.ictj.org/about/board . [24.6.2021].
27 Ulster University’s Transitional Institute (THI).
28 International Journal for Transitional Justice.
29 Routledge Studies in Peace and Conflict Resolution.
30 Department of Peace Studies der University of Bradford.
TRADUÇÃO
338 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
Tais instituições são os locais onde o conhecimento se configura, se
desenvolve, se apropria e circula sob a marca da JT. Parte do conhecimento
gerado é transferido para processos de JT em andamento. O conhecimento
também chegou às Nações Unidas. A ONU criou o cargo de Relator Especial
para a promoção da verdade, justiça, reparação e garantia de não recorrência
em 2012. Até 2018, o primeiro titular foi o conselheiro colombiano do ICTJ, Pablo
de Greiff. A partir de 2020, a área de memória também fará parte do escopo do
cargo. Por último, importa referir que também recentemente foram promovidos
jovens talentos sob a marca da TJ. Por exemplo, a Academia de Genebra oferece
desde 2020 (por um bom dinheiro) o Mestrado em Justiça Transicional, Direitos
Humanos e Estado de Direito31.
JUSTIÇA TRANSICIONAL E HISTORIOGRAFIA
Nas explicações anteriores, o conhecimento historiográfico desempenhou
um papel secundário. Os (as) historiadores (as) que trabalham com crimes contra
os direitos humanos e transições democráticas hesitaram inicialmente em utilizar
o termo JT. Dos textos que passaram pelo filtro seletivo da coletânea de Kritz de
1995, apenas um foi escrito por um historiador: Peter Novick, da Universidade
de Chicago. Novick era especialista em lidar com os colaboradores de Vichy
na França do pós-guerra e em memória coletiva do Holocausto nos Estados
Unidos. A participação de historiadores em congressos, workshops e painéis sob
a marca da JT também foi limitada durante a fase de formação da JT. Durante
muito tempo, os (as) historiadores (as) também eram raramente encontrado(a)
s nos discursos publicados. Entre 2003 e 2008, Laurel Fletcher e Harvey M.
Weinstein pesquisaram os principais periódicos de língua inglesa em busca de
artigos sobre temas da JT e encontraram apenas três artigos da área de história
(FLETCHER; WEINSTEIN, 2015, p. 183; SCHNEIDER, 2017, p. 108). Isso mudou nos
anos seguintes: de 578 autores, pelo menos 31 historiadores publicaram artigos
(incluindo revisões coletivas) na Revista Internacional de Justiça Transicional32
entre 2007 e 2020.33
31 Transitional Justice, Human Rights and the Rule of Law.
32 International Journal for Transitional Justice.
33 Essas informações são baseadas em um levantamento feito por Katharina Danisch.
TRADUÇÃO
339 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
Durante muito tempo, os historiadores trouxeram os seus conhecimentos
para o campo da JT, principalmente nas áreas de reconstrução, avaliação e
documentação dos crimes do fascismo europeu e do estalinismo. Como mostra
a pesquisa de Guillaume Mouralis (2008; 2019), Sanya Romeike (2016) e Annette
Weinke (2002; 2006; 2017), Nesse contexto, a pesquisa sobre o confronto
do sistema de justiça criminal com o passado violento em conexão com as
transformações políticas fez grandes progressos de acordo com as premissas
historiográficas. Embora não tenha havido uma grande comissão da verdade
na Alemanha, vários comitês individuais lançaram luz sobre o comportamento
institucional do Estado. A Comissão Histórica Independente (UHK)34, criada em
2005, por exemplo, investigou o papel do Serviço de Relações Exteriores durante
a era nacional-socialista e como isso foi tratado após o restabelecimento do
Ministério das Relações Exteriores. E a Comissão Histórica Independente,
criada em 2016 para investigar a história do Ministério da Alimentação do Reich
e a continuidade das autoridades nazistas, tratou de questões semelhantes em
outro ministério. As relações da Alemanha com os países vizinhos durante a era
nacional-socialista também foram investigadas por comissões de historiadores
(as) (CORNELIßEN; PEZZINO, 2017). Mesmo que o vocabulário da JT não seja
utilizado em conexão com os exemplos mencionados, eles são uma prova de que
o conhecimento historiográfico está em demanda nas áreas da JT orientadas
para a aplicação. No entanto, este é particularmente o caso de processos
concluídos, distantes e definíveis. Por outro lado, muitos historiadores preferem
precisamente esta constelação porque podem então realizar uma avaliação
global em diferentes níveis a partir de múltiplas perspectivas, tendo em conta
o material de origem acessível. No entanto, este tipo de pesquisa é demorado e
não é adequado para comparações globais.
Na era atual da JT, as competências históricas são cada vez mais procuradas.
Durante os processos judiciais, os historiadores (as) auxiliam os investigadore(a)s
e juíze(a)s no fornecimento e contextualização da interpretação do material. Eles
também descrevem e interpretam o percurso e os resultados dos procedimentos.
O historiador sérvio Vladimir Petković escreveu um artigo perspicaz sobre o tema
(PETKOVIC, 2018). O(a)s historiadore(a)s também poderiam desempenhar um
papel mais importante do que anteriormente nas comissões da verdade. O motivo
34 Unabhängige Historikerkommission.
TRADUÇÃO
340 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
pelo qual o conhecimento histórico é frequentemente excluído do trabalho de
tais comitês e o que os historiadores pensam sobre isso mereceriam um estudo
separado.
TRADUÇÃO
341 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
O(a)s historiadore(a)s desempenham um papel muito mais importante no
campo da memória coletiva do que em relação ao direito/justiça e à verdade nos
processos de JT. Desde a década de 1990, a cultura histórica e a história pública
experimentaram um enorme crescimento.35 Eles são interdisciplinares, embora
com um forte envolvimento da ciência histórica, e se beneficiaram enormemente
em termos teóricos, conceituais e metodológicos do campo em expansão dos
estudos da memória, que se desenvolveu em diálogo com o estabelecimento de
locais memoriais, museus e centros de documentação. Seu compromisso com o
quê e como também é necessário na didática da história, ou seja, na comunicação
da história para as gerações futuras.
Acima de tudo, porém, quando se trata do conteúdo do passado e de sua
avaliação, a ciência histórica pode, e de fato deve, usar seus métodos para realizar
pesquisas básicas. Nas sociedades em transição, o passado é contestado. O
modo de debate é altamente emocionalizado, os argumentos são frequentemente
apresentados de forma polêmica e com intenção tática. Nessas condições, o
conhecimento histórico apresentado de forma prudente que não queira ser
politicamente instrumentalizado corre o risco de não ser percebido. Como mostra
a historiadora Marina Franco, recorrendo ao exemplo da Argentina (FRANCO,
2018), é quase inevitável que os (as) cientistas das sociedades pós-ditadura e
pós-conflito sejam associados a um campo ou a outro. A história contemporânea
geralmente entra nesse espaço de discussão ou discurso com um atraso ou seja,
em um momento em que os representantes de outras disciplinas já marcaram
há muito tempo (embora não tenham medido) os principais pontos e tópicos
sobre o passado utilizando seus próprios métodos, publicando monografias,
artigos de periódicos e artigos de opinião em jornais, bem como entrevistas de
rádio e televisão. Nessas condições, a competência da história contemporânea
é indispensável para questionar ou diferenciar a desconstrução de opiniões que
os grupos de interesse (organizações de vítimas, exército etc.), as comissões da
verdade, os atores políticos ou a mídia trouxeram ao mundo. No que diz respeito
à Argentina, Franco constata uma verdadeira “explosão histórica” desde meados
da primeira década do novo milénio; há, portanto, uma necessidade de discussão
sobre o passado. De acordo com Franco, o principal tópico que ainda domina a
35 Consulte também o capítulo 2 dessa antologia de Susanne Schregel, Jan Hansen e Daniel Gerster.
TRADUÇÃO
342 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
pesquisa e o discurso atualmente é a “ditadura”. Nesse contexto, a historiografia
(que inclui todos os estudos acadêmicos que lidam com o passado violento) tem
trabalhado com termos como “terrorismo de Estado” ou “genocídio”. O vocabulário
da ditadura está sendo apresentado com adjetivos; as pessoas discutem se
a ditadura foi mais “militar-corporativa” ou “civil-militar-eclesiástica”. Outra
controvérsia, de acordo com Franco, está relacionada aos componentes centrais
da JT, ou seja, “direito” versus “verdade” ou “direito” e “verdade”. As implicações
de tais disputas em situações de transição ou pós-conflito são consideráveis, e é
por isso que é ainda mais desejável que os pesquisadores mantenham distância
do objeto de pesquisa e dos (as) protagonistas, seus pensamentos e suas ações,
a fim de intervir nas disputas como um fator corretivo. (FRANCO, 2018, p. 148)
Independentemente das condições de trabalho muitas vezes difíceis nas
sociedades pós-ditadura e pós-guerra civil, o conhecimento baseado na ciência
histórica pode dar um contributo importante. Os historiadores se beneficiam da
virada cultural e global, mas também do reajuste praxeológico do sujeito desde
o início do desenvolvimento do campo da JT. Muitos estudos de JT escritos por
não-historiadores falam e escrevem sobre processos de JT sem examinar em
detalhe os processos entre o ponto de partida e o resultado. Além da dimensão
discursiva e representativa, a ciência histórica também leva a sério as ações das
pessoas, ou seja, o que elas fazem e como o fazem, conforme rotinizado por regras
e determinado por constelações históricas. Nada substitui a descrição densa,
que só se torna explicativa no espaço social e cultural através da contextualização
histórica. A investigação histórica vê os processos como abertos (SCHNEIDER,
2017, p. 115, 120). E, em geral, adota uma perspectiva de prazo mais longo do que
os estudos vinculados à pesquisa de transição restrita.
A história do direito penal, há muito negligenciada pela corporação
histórica, recebeu um novo impulso através destas inovações. Em sua tese de
habilitação publicada em 2019, O momento Nuremberg. O processo internacional,
os advogados e a questão racial36, Guillaume Mouralis, por exemplo, examina o
“Projeto Nuremberg” como um processo moldado por advogados, promotores,
investigadores, consultores jurídicos, historiadores e intérpretes. Ele vê os
resultados como uma consequência das negociações interculturais e da
36 Le moment Nuremberg. Le procès international, les lawyers et la question raciale (2019). Dispo-
nível em: http://www.pressesdesciencespo.fr/fr/livre/?GCOI=27246100484670
TRADUÇÃO
343 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
aproximação entre as pessoas delegadas pelas potências aliadas vitoriosas.
Diferentes formações acadêmicas e pós-acadêmicas e influências e inovações
culturais divergentes desempenharam aqui um papel central. O “momento
Nuremberg” foi certamente suficiente para proporcionar uma abordagem
internacional para a punição de crimes contra a paz, a humanidade, a participação
em conspirações e a formação de organizações criminosas. Mas a janela de tempo
foi muito curta para gerar um ambiente transnacional com normas jurídicas, de
direito internacional e processuais internacionais, especialmente porque os
interesses políticos eram onipresentes ao lado dos critérios jurídicos. Não só a
formação do bloco que estava surgindo logo dificultou o estabelecimento de uma
cultura penal internacional/universal, como também houve reservas no “Ocidente”
democrático. Os EUA expressaram reservas quanto a uma internacionalização
forçada do crime contra a humanidade porque isso ameaçava minar o monopólio
da interpretação em seu próprio país, que ainda estava estruturado em uma
base racista (MOURALIS, 2019, p. 119). No entanto, as organizações de direitos
civis dos EUA têm se referido a “Nuremberg” desde então. O estudo de Mouralis
culturaliza os procedimentos do tribunal criminal. O estudo lida com o problema
do universalismo versus particularismo. Ainda há uma grande necessidade
de pesquisas históricas básicas bem fundamentadas em todos os estados
de transição recentes. Nesse contexto, só podemos concordar com o apelo
de Susanne Schregel, Jan Hansen e Daniel Gerster para o estudo das forças
armadas nas sociedades no capítulo 2 da coletânea Pesquisa histórica sobre
paz e conflitos: a quadratura do círculo?37 (2023). Ainda existem poucos estudos
sobre esse assunto nos países e partes do mundo que mencionei neste ensaio. A
justificativa frequentemente ouvida de que as forças de segurança não gostam
de tornar seus arquivos acessíveis não é realmente uma desculpa convincente.
Afinal de contas, a história contemporânea quase sempre pode encontrar outras
maneiras de trabalhar. As estruturas e culturas autoritárias também precisam
ser investigadas, e em períodos que vão muito além da versão resumida dos
processos de transição. Por fim, a história contemporânea deve se esforçar mais
para levar em conta as transições em pesquisas históricas gerais.
37 Historische Friedens- und Konfliktforschung: Die Quadratur des Kreises? (2023).
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ÁREAS PROBLEMÁTICAS E ÁREAS DE TENSÃO
As considerações anteriores mostraram que o campo da JT mudou e se
abriu nas últimas décadas. Quanto maior se tornou a experiência com a JT, mais
claro ficou que a transição para sociedades democráticas liberais apoiadas por
medidas da JT para lidar com crimes graves no passado e superá-los não poderia
ser alcançada tão rápida e facilmente como as vozes otimistas acreditavam na
década de 1990.
A crescente comunidade de especialistas em JT foi, portanto, forçada
a revisar os pressupostos e instrumentos básicos anteriormente válidos e a
aprimorar as abordagens para superar a violência a partir de uma perspectiva
de TJ. Pablo de Greiff resumiu esse desafio em uma frase: “A justiça transicional
não levou em conta o contexto de forma suficiente, [ela é] muito formulaica
[formelhaft] e tecnocrática” (GREIFF, 2020, 255). O diagnóstico de De Greiff de
que circunstâncias diferentes exigem abordagens diferentes e que é necessário
mais pragmatismo no futuro está correto, mas deveria ser formulado de forma
mais concreta.
Portanto, gostaria de concluir mencionando cinco áreas problemáticas
interconectadas que estão sendo trabalhadas atualmente na pesquisa e
na prática: Universalidade versus particularidade, temporalidade estreita
versus ampla, mono versus multidisciplinaridade, falta de participação versus
participação e centralidade no Estado versus desnacionalização.
Universalidade versus particularidade: Como cada transição tem um ponto
de partida diferente, um curso diferente e, portanto, resultados diferentes, não
existe um caminho certo. No entanto, isso não significa que o principal objetivo da
JT de restaurar os direitos e a dignidade das vítimas em todo o mundo, apoiar os
processos de democratização e promover a coexistência deva ser abandonado.
A crítica dos partidários de Fukuyama não é sobre a validade global dos direitos
humanos, mas sim sobre a ingenuidade histórica desta geração sobre o que era
possível e sua atitude eurocêntrica presunçosa em relação aos métodos que
devem ser usados para moldar o futuro. Neste contexto, foi criticado, com razão,
o fato de ter sido dada pouca consideração aos contextos nacionais e locais
(WOLFF, 2022). A Colômbia está atualmente mostrando que as coisas podem
ser diferentes. Este país, comprometido com a “paz territorial”, tornou-se um
verdadeiro laboratório para perspectivas e abordagens locais da JT (DIAZ et. al;
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345 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
2021, p. 106-116).
Temporalidade restrita versus ampla: a suposição de que as medidas da
JT poderiam ser limitadas a um curto período de tempo para produzir o efeito
desejado também questionou uma segunda suposição básica da geração de
Fukuyama. Hoje, é um fato bem documentado que os processos de transição
levam muito tempo, não raramente demoram muito, e podem estar associados
a constantes retrocessos. É necessário, mas não suficiente, aplicar medidas
restaurativas e retributivas, promover processos de democratização e
proporcionar justiça e direitos às vítimas. São necessárias várias gerações
para que sociedades divididas aprendam a viver juntas. Conforme mencionado
acima, não são apenas o(a)s especialistas que se debatem sobre como avaliar o
passado. Mesmo décadas após o fim das guerras civis e das ditaduras, o passado
geralmente é altamente politizado. Portanto, as transições acompanhadas por
medidas da JT duram muito mais do que se supunha na década de 1990. Um
passado violento é doloroso. Ele não desaparece com o passar das gerações,
não pode ser “apagado” “deixando a grama crescer” ou “pondo uma pedra [einen
Schlussstrich zieht] sobre ele” porque o debate público é caracterizado por
tensões, novos pontos focais e questões que surgem repetidamente (JELIN,
2017). Mas, sem surpresa para o(a)s historiadore(a)s especializado(a)s, o ponto
de partida também é frequentemente questionado, por exemplo, quando os
movimentos sociais perguntam sobre culturas ou estruturas de violência cujas
origens são muito mais antigas. Nas ex-colônias, em particular, é (também) uma
questão de lidar com legados sociais, econômicos e culturais.38 Portanto, Sharp
apontou corretamente que é vital para o campo da JT emancipar-se da transição
“paradigmática”, que é sempre projetada para o curto prazo. É preciso romper
com pressupostos básicos universalistas, descartar um habitus neocolonialista
e arrogante e expandir os instrumentos limitados (“reducionistas”) da JT. (SHARP,
2013, p. 163)39 Isso leva tempo.
Mono versus multidisciplinaridade: Sharp e outros reformadores consideram
que a produção de conhecimento sobre paz, conflitos e desenvolvimento, bem
38 Esse autor examina o direito internacional, ao qual atribui a continuidade do colonialismo mesmo
em contextos pós-coloniais. Ele considera o uso e a distribuição de terras, bem como o tratamento de
minorias, como uma área central de responsabilidade. Temas como a questão da terra só podem ser
tratadas em longo prazo.
39 Ver McAuliffe (2021, p. 817-847).
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como os estudos culturais em geral, são fundamentais para poder analisar e
aconselhar em um campo tão expandido e renovado (HODDY; GREADY, 2021;
BAKER; WOCHNIK, 2016; SHARP, 2013). Trata-se, portanto, de incluir outros
campos ou disciplinas, a fim de combinar competências adicionais sob a égide
da JT. Poderiam surgir aqui sinergias com a investigação contemporânea e
histórica sobre a paz e os conflitos. O investigador da paz Johan Galtung já tinha
criticado duramente a “abordagem de paz liberal” na sua publicação de 1976, Três
abordagens realistas para a paz: Manutenção da paz, pacificação e construção
da paz40, e apelou a uma perspectiva abrangente e de longo prazo levando em
consideração as variáveis socioeconómicas e culturais. Sob o termo construção
da paz, ele resumiu medidas que se centraram na sustentabilidade através da
mudança dos contextos socioeconômicos e do nível de percepção e consciência.
Essa abordagem, que também renovou a pesquisa sobre paz e conflitos
porque poderia ser aplicada ao número crescente de conflitos intraestatais,
só se concretizou de fato na ONU após o fim da Guerra Fria. Da mesma forma,
a renovada pesquisa sobre Desenvolvimento41 – que agora se concentrava na
participação, nas capacidades, nos direitos e no desenvolvimento humano –
também forneceu um impulso importante para a pesquisa mais recente sobre JT.
Nesse contexto, o projeto transnacional Justiça Transicional e Desenvolvimento:
Fazendo conexões42, liderado por Pablo de Greiff e Roger Duthie e sediado no
ICTJ, é particularmente digno de nota (GREIFF; DUTHIE, 2009, p. 18). Ele tentar
utilizar as convergências entre a JT e Desenvolvimento e explorar o potencial de
sinergia de ambos os campos.
Falta de participação versus participação: o campo da JT também mudou
significativamente em relação aos agentes envolvidos. Embora os Estados
centralizados tenham sido inicialmente o principal ponto de contato na área da JT
para o desenvolvimento e a implementação de medidas, também houve aqui uma
mudança. Os tecnocratas da JT da geração de Fukuyama tiveram que suportar a
acusação de agir muito longe das pessoas mais afetadas pelos conflitos – grupos
étnicos, minorias como a comunidade LGBTQIA+ e, em muitos países, também
mulheres e crianças – e, portanto, negar-lhes a participação e não promover
adequadamente suas opções para lidar com a violência e a autodeterminação
40 Three Realistic Approaches to Peace: Peacekeeping, Peacemaking and Peacebuilding (1976).
41 Development Studies.
42 Transitional Justice and Development: Making Connections.
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347 albuquerque: revista de história - v. 16, n. 32, ago. - dez. 2024 I e-issn: 2526-7280
(HODDY; GREADY, 2021, p. 2; SHARP, 2013, p. 169-170). Até a Resolução 1325 do
Conselho de Segurança das Nações Unidas de 2000, que forma a base para o
programa Mulheres, Paz e Segurança (WPS)43 das Nações Unidas, os círculos de
JT também pararam de ignorar a violência baseada em gênero e suas origens
estruturais nas agendas internacionais de JT e de Construção da Paz44. Essas
abordagens diferenciadas, que levam em conta o gênero, a idade ou a etnia das
vítimas, são utilizadas, mas, na opinião de muitos observadores da área, elas
devem ser mais desenvolvidas no futuro, estendidas a grupos como a comunidade
LGBTQIA+ e refletidas de forma consistente em medidas localmente concretas
(SCHULZ, 2020, p. 691-710).
Centralização no Estado versus desnacionalização: O último ponto de
crítica, que está intimamente ligado ao aspecto anterior da falta de participação,
ou seja, excesso de burocracia e centralismo estatal, também é conhecido de
outros contextos. Galtung (1976) já havia abordado esse aspecto quando pediu
uma abordagem de baixo para cima em vez de uma abordagem puramente de
cima para baixo.
Em termos de implementação, isso significa aplicar consistentemente
métodos baseados na comunidade para levar em conta as necessidades, ideias
e tradições locais. Portanto, a virada local também deve ser implementada na
JT (KOCHANSK, 2018). Assim, trata-se de questionar a eficácia do conhecimento
científico “ocidental”, adaptando-o aos contextos locais, lidando com “outras”
ideias de justiça, por exemplo, e permitindo que mulheres, grupos étnicos
marginalizados e outras minorias, sobretudo as populações (outrora) colonizadas,
participem (BRUNNER, 2020, p. 79). Nesse contexto, também é necessário
desconstruir a terminologia que foi predominantemente inventada no mundo
anglo-americano. Nessa forma de promover a justiça restaurativa, os (as)
“especialistas” são, acima de tudo, mediadores (as).
Na Colômbia, por exemplo, onde o conflito armado sempre foi travado em
territórios indígenas, uma equipe de pesquisa intercultural da Universidade
do Rosário45 (Bogotá) está trabalhando com métodos (“Pesquisa de Ação
Participativa”) que tem recebido pouca atenção no processo de paz nacional,
como o mapeamento corporal, dança e canto na interface entre gênero e etnia. O
43 Women, Peace and Security (WPS).
44 Peacebuilding.
45 Universidad del Rosario.
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grupo apoia as mulheres indígenas a trazerem suas perspectivas e epistemes, que
raramente são representadas em público, como vítimas e como perpetradoras no
contexto do trabalho da Comissão da Verdade. O objetivo é evitar “uma hierarquia
sexual e racial hegemônica e uma perspectiva deslocalizada da JT” (SANTAMARÍA
et. al, 2020, p. 56-79). Para possibilitar a comunicação apesar de sistemas
epistemológicos, visões de mundo, modos de comunicação e perspectivas
fundamentalmente diferentes, os métodos interculturais e artísticos estão
cada vez mais ocupando espaço no discurso prático e teórico sobre a JT. As
experiências de violência e suas consequências, que em determinados contextos
culturais são indescritíveis, dolorosas demais ou dificilmente explicáveis para
pessoas de fora, podem ser expressas em trabalhos criativos, geralmente não
verbais. Isso as torna visíveis e decifráveis para os “outros” e, portanto, forma
uma base para uma aproximação baseada no respeito mútuo (COHEN, 2020, p.
1-13).
CONCLUSÃO E PERSPECTIVAS
De modo geral, pode-se dizer que nas últimas duas décadas o campo da JT
ganhou importância em todo o mundo, apoiado por um processo considerável
de institucionalização. Isso se explica pelo fato de que o “fim da história” não foi
alcançado de forma alguma e os conflitos e sistemas autoritários ainda estão na
ordem do dia. Transições bem-sucedidas e sustentáveis apoiadas por medidas da
JT são a exceção e não a regra. As maiores decepções ocorreram recentemente
no Afeganistão, na Síria e no Iraque, onde as circunstâncias simplesmente não
permitem um impacto duradouro da JT. Os atores no espaço de conhecimento
da JT reagiram de forma criativa aos fracassos: o campo está se abrindo,
adotando cada vez mais uma abordagem multiperspectiva, tentando combater o
eurocentrismo por meio de abordagens participativas, pós-coloniais e abertas a
gênero e etnia, harmonizando diferentes interesses e percepções em nível local e
nacional, ampliando a visão das estruturas históricas profundas e desenvolvendo
perspectivas para futuros mais distantes. No momento, não é possível prever
com certeza se a JT perderá sua própria identidade com a caça furtiva em outros
campos e disciplinas (EVANS, 2018; GREADY; ROBINS, 2019) ou se será capaz de
se reinventar com sucesso.
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Independentemente disso, o conhecimento da Pesquisa Histórica sobre Paz
e Conflitos (PHPC)46 ganhou importância com o surgimento dos campos práticos
da didática histórica, da cultura histórica e da história pública. No entanto, o
conhecimento de historiadores especializados também é solicitado quando se
trata de interpretar passados violentos. Encontrar maneiras de sair de passados
violentos requer análises e descrições precisas. É nesse ponto que a PHPC e a
JT se encontram. Em programas de estudo, instituições, comissões da verdade
e cultura histórica, a experiência acumulada pelos historiadores tem sido (muito)
pouco utilizada até o momento, sobretudo em relação a estudos de casos
históricos e abordagens metodológicas (especialmente ao lidar com fontes). Por
outro lado, a PHPC também poderia se beneficiar mais da JT no futuro, revisando
suas conclusões de inúmeros estudos sob a marca da JT com base em processos
de paz anteriores.
Nesse contexto, um exame mais intensivo da pesquisa na e sobre a África e,
acima de tudo, na e sobre a América Latina me parece particularmente valioso.
A PHPC também pode aprender com os estudos sobre a dimensão étnica e de
gênero, os processos de reconhecimento e as descobertas sobre a dimensão
intergeracional dos conflitos (primeira, segunda e terceira geração) ao lidar
com guerras civis e ditaduras. Nessa perspectiva, os estudos de área poderiam
assumir cada vez mais uma função de ponte.
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