APRESENTAÇÃO – DOSSIÊ: FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO NEOLIBERAL:

INCLUSÃO ESCOLAR, EDUCAÇÃO INCLUSIVA E DIVERSIDADE


INTRODUCTION – DOSSIER: TEACHER TRAINING IN THE NEOLIBERAL CONTEXT: SCHOOL

INCLUSION, INCLUSIVE EDUCATION AND DIVERSITY


Jacqueline de Oliveira Veiga Iglesias1

https://orcid.org/0000-0003-3476-8109 http://lattes.cnpq.br/3100475653423566


Yara Fonseca de Oliveira e Silva2

https://orcid.org/0000-0001-5725-478X http://lattes.cnpq.br/1269420694190937


Carlos Eduardo Candido Pereira3

https://orcid.org/0000-0002-9871-0160 http://lattes.cnpq.br/7698913311024550


https://doi.org/10.46401/arec.2025.v17.24260


  1. Mestre e doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual de Goiás (UEG) e em Pedagogia pela Faculdade Alfa América. Docen- te do curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Goiás (UEG) - Câmpus Sudoeste – Sede: Quirinópolis. Membro do Grupo de Pesquisa Políticas Educacionais e Formação de Professores (GPEFORP/CNPq/UEG/ GO). E-mail: jacqueline.iglesias@ueg.br

  2. Mestre em Educação pela Universidade Federal de Goiás (UEG). Doutora em Políticas Públicas, Estraté- gias e Desenvolvimento pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Graduada em Pedagogia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO). Professora titular da Universidade Estadual de Goiás no Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Educação, Linguagem e Tecnologias (UEG/PPG-IELT). Líder do Grupo de Pesquisa Políticas Educacionais e Formação de Professores (GPEFORP/CNPq/UEG/ GO). E-mail: yara.silva@ueg.br

  3. Mestre e doutor em Educação Escolar pela Faculdade de Filosofia e Letras de Araraquara da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCLAr/Unesp). Graduado em Pedagogia pela Universidade Esta- dual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp). Professor Formador da Secretaria Municipal da Educação de Fortaleza. Membro do Grupo de Pesquisa Pesquisa Políticas Educacionais e Formação de Professores (GPE- FORP/CNPq/UEG/ GO). E-mail: candidounesp@gmail.com


A formação do professor, no contexto das políticas neoliberais, tem sido objeto de discussões na maioria dos países neste século XXI. No Brasil, a discussão tem se ampliado ao considerar o professor como um sujeito otimizador do mercado de trabalho, no qual a educação pública se configura como uma mercadoria sujeita à privatização. Tal tendência está explícita na intenção do governo federal de diminuir os investimentos nas instituições públicas e ampliá- los nas privadas.

No que se refere à formação especializada do professor, a educação inclusiva tem se revelado como um desafio. A carência de recursos e de apoio das instâncias governamentais tem impelido o próprio educador a buscar, de forma autônoma, os meios para sua formação continuada. Essa realidade reflete e, ao mesmo tempo, reforça a lógica neoliberal, na qual a responsabilidade pela qualificação profissional é transferida do Estado para o indivíduo.

Não por outro motivo, as instituições privadas vêm se capitalizando significativamente com a crescente demanda por cursos e formações, apesar de grande parte das ofertas que disponibilizam se restringir a uma abordagem pragmática, focada na mera reprodução de práticas pedagógicas, negligenciando a necessária e aprofundada base teórica que sustenta a educação inclusiva. Tal lacuna compromete a formação integral do professor, transformando a prática pedagógica em um mero conjunto de técnicas desprovidas de reflexão crítica e de um embasamento conceitual sólido.

Nesse contexto, instaura-se uma divergência entre a legislação e a realidade escolar, uma vez que, apesar de os marcos legais legitimarem o direito à educação inclusiva, sua implementação enfrenta diversos desafios, o que evidencia uma exclusão velada e que exige denúncias e ações concretas de ruptura. Consequentemente, fortalecer a discussão sobre a formação do professor surge como um requisito essencial para garantir a criação de uma proposta de práticas pedagógicas adequadas e alinhadas às demandas contemporâneas de inclusão escolar.

Este dossiê reúne, portanto, estudos que analisam criticamente os impactos do neoliberalismo nas políticas públicas educacionais e sua repercussão na formação docente, nas condições de trabalho e nas práticas pedagógicas voltadas à inclusão. Os artigos abordam diferentes dimensões da temática e estão organizados em cinco eixos: Políticas Educacionais e Neoliberalismo; Formação Docente e Saberes Interdisciplinares; Educação Inclusiva e Precarização do

Trabalho; Governamentalidade, Normalização e Subjetividades; e Formação

Docente na Educação Especial.

No que tange ao eixo Políticas Educacionais e Neoliberalismo, o artigo “Educação brasileira em tempos de neoliberalismo: entre discurso de melhoria e realidades excludentes”, de Gilson Xavier de Azevedo, Jacqueline de Oliveira Veiga Iglesias, Joana Correa Goulart e Eloane Aparecida Rodrigues Carvalho, reflete sobre as principais questões hodiernas que envolvem a educação brasileira, com ênfase na primeira década do século XXI. O texto destaca a relação entre a educação e o desenvolvimento econômico, as políticas públicas e econômicas que a afetam e a efetividade das ações governamentais para a transformação social.

Nos meios de comunicação, é comum observar a divulgação de índices educacionais positivos, sobretudo, em épocas de campanhas eleitorais. Os autores do artigo questionam, que se a educação oferecida ao brasileiro de fato melhorou, por que isso não é tão visível nos diversos setores da economia nacional? A busca pela resposta a essa questão que se levanta conduzirá o leitor aos pontos elementares desta discussão, perpassando análises de fatos do cotidiano realizadas no período de 2001 e 2008, bem como em artigos que tratam da educação e políticas públicas em tempos neoliberais.

Neste texto, constata-se que, sob a influência da globalização e do neoliberalismo, as políticas educacionais brasileiras estão imersas em discursos de melhoria que, todavia, estão entrelaçados com a permanência de problemas, tais como a falta de recursos, a privatização da educação, o clientelismo e a exclusão social. É urgente, portanto, aprofundar os questionamentos sobre as políticas educacionais à luz da complexidade da sociedade brasileira e dos impactos da globalização, para que a educação possa efetivamente promover inclusão e atuar como agente de emancipação social.

Em referência ao eixo Formação Docente e Saberes Interdisciplinares, o estudo “Educação, neurociência e linguagem: um tripé fundamental para a formação de professores alfabetizadores”, de Kênia Bomtempo, Márcia Friedrich e Sangelita Miranda Franco Mariano, aborda a relevância da capacitação do professor alfabetizador para reconhecer problemas de aprendizagem e enfatiza a função da neurociência no entendimento dos transtornos de aprendizagem como a dislexia. Trata-se de uma revisão de literatura na qual as autoras deste artigo, destacam a importância de o professor compreender as particularidades

das disfunções e distingui-las das dificuldades de aprendizagem, planejando intervenções apropriadas. Também é ressaltada a relevância do envolvimento da família nesse processo.

No eixo Educação Inclusiva e Precarização do Trabalho, destaca-se o artigo “Educação Inclusiva em Tempos de Precarização: análise das Políticas de Contratação de Profissionais de Apoio na Região Metropolitana de Goiânia”, de Jacqueline de Oliveira Veiga Iglesias, Yara Fonseca de Oliveira e Silva, Carlos Eduardo Candido Pereira, Edna Mariade Jesus, Maria Josédo Nascimentoe Sonilda Aparecida de Fátima Santos. Nele, é analisado o impacto do neoliberalismo na educação pública em Goiás, com foco na inclusão de estudantes com deficiência.

O estudo destaca os desafios enfrentados pelas instituições, tais como a inadequação da formação de profissionais e a precarização do trabalho educacional, sob a ótica de que é a lógica neoliberal que reduz investimentos, dificultando a qualificação docente e a implementação de práticas inclusivas. A análise de editais revela que são mínimas as exigências para o exercício de funções essenciais, o que reforça a prática de um modelo assistencialista, enquanto divergências entre diretrizes pedagógicas e práticas administrativas evidenciam fragilidades na gestão pública. O estudo aponta a necessidade de políticas que fortaleçam a qualificação e os investimentos na educação inclusiva. O eixo Governamentalidade, Normalização e Subjetividades tem como diretriz a obra “Governamentalidade e educação inclusiva em tempos neoliberais”, de Thelma Bergamo e Laís Alice Oliveira Santos . Com o avanço do neoliberalismo, a educação tem se configurado como um espaço privilegiado para a efetivação da inclusão por meio de políticas, discursos, estratégias e tecnologias de saber- poder. Nesse contexto, o Estado governamentalizado assume especial interesse entre a população, ao elaborar e fazer circular práticas que moldam formas de vida orientadas para a competitividade, a eficiência e a autorresponsabilização. As reformas neoliberais instituem normas que posicionam os sujeitos em redes de saberes e espaços mercadológicos, convertendo-os em capital humano

normalizado e adaptado às demandas do sistema econômico.

O artigo das professoras Bergamo e Santos presente neste dossiê, tem como objetivo problematizar a educação inclusiva como recurso estratégico de normalização e produção de subjetividades úteis ao mercado, articulando-a aos conceitos de governamentalidade e biopolítica. Trata-se de um estudo exploratório, de caráter bibliográfico, desenvolvido por meio da análise qualitativa

de obras de referência e produções acadêmicas de Michel Foucault e de outros autores que discutem a interface entre neoliberalismo e educação inclusiva. Os resultados indicam que, embora amparada por marcos legais, a inclusão escolar é fragilizada por racionalidades neoliberais que reduzem seu potencial emancipatório e reforçam processos de in/exclusão, exigindo uma abordagem crítica capaz de tensionar discursos hegemônicos e fomentar práticas pedagógicas que valorizem as diferenças como potência transformadora.

Por fim, no eixo Formação Docente na Educação Especial foi analisado o ensaio “Prática pedagógica e inclusão escolar no Brasil: breve análise sobre a formação docente na educação especial”, de Jackeline Miranda de Barros e Yara Fonseca de Oliveira e Silva, que faz uma análise crítica da intrínseca relação entre a formação docente e a prática pedagógica. O estudo apresenta a evolução histórica da formação de professores para a educação especial no Brasil, desde a fase segregacionista e compensatória até a transição para o paradigma inclusivo atual.

A análise das autoras do ensaio associa marcos legislativos importantes, tais como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, 1996), a Resolução CNE n.º 02/2001, esta resolução determina que as escolas regulares precisam se organizar para atender os alunos da inclusão, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI, 2008) e os impactos que causam na qualificação e nos papéis dos professores “capacitados” e “especializados”. A ambiguidade persistente nas trajetórias formativas e a emergência do professor de Atendimento Educacional Especializado (AEE) são exploradas, evidenciando desafios para a garantia de uma preparação docente abrangente. O texto conclui enfatizando a necessidade crucial de uma política de formação docente coesa e contínua, que sustente práticas pedagógicas inclusivas, supere as dualidades históricas e assegure que todos os estudantes com NEE — Necessidades Educacionais Especializadas dentre os quais, aqueles com deficiência — recebam educação de qualidade no sistema comum de ensino. A análise dos cinco eixos propostos neste dossiê sobre a formação do professor no contexto do neoliberalismo revela uma interconexão profunda e multifacetada entre eles. Embora abordem diferentes facetas, todos convergem para uma crítica central: a submissão da educação e da formação docente, em particular, a uma lógica de mercado que precariza o trabalho e despolitiza a

prática pedagógica.

A relação entre políticas educacionais e neoliberalismo estabelece o cenário macro. As reformas educacionais, sob o manto de eficiência e qualidade, frequentemente promovem a privatização de serviços, a redução do financiamento público e a responsabilização individual do profissional. Essa lógica neoliberal não apenas molda, como também distorce a formação docente e os saberes interdisciplinares. Em vez de uma formação sólida e crítica, pautada no diálogo entre diferentes campos do conhecimento, o que se observa é a valorização de uma formação técnica, fragmentada e orientada para a “prática pela prática”, ignorando a complexidade do contexto educativo.

Ao reunir vozes comprometidas com a transformação educacional, este dossiê propõe uma reflexão profunda sobre os caminhos possíveis para a implementação de uma educação pública de qualidade, pautada na equidade, na justiça social e na valorização da diversidade. Os artigos aqui apresentados não apenas denunciam os efeitos da mercantilização da educação, como também apontam estratégias de resistência e fortalecimento da formação continuada como instrumento de emancipação.

O leitor deste dossiê é, portanto, convidado a mergulhar nestas análises e a participar do debate sobre os rumos da formação docente em tempos de neoliberalismo — com olhar crítico, sensível e comprometido com a inclusão educacional.


REFERÊNCIAS


BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação na- cional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996.


BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Reso- lução CNE/CEB n. 2, de 11 de setembro de 2001. Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Espe- cial na Educação Básica. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 14 set. 2001. Seção 1, p. 39.


BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília, DF: MEC/SEE, 2008.