MEU DISCURSO EM MATEMÁTICA É FALHO
GATILHOS DE PROBLEMAS IDENTIFICADOS NA INTERPRETAÇÃO PARA LIBRAS
Resumo
Quando o docente tem ciência de que suas escolhas de técnicas praxeológicas, no âmbito do discurso, podem influenciar as escolhas praxeológicas do intérprete educacional em sua atuação, conforme descrito por Souza, Borges e Bittar (2023), baseados na Boa Construção Discursiva (BCD) de Oliveira e Machado (2023), nesse ambiente bilíngue traduzido, como descrito por Witchs e Zilo (2021), pode florescer possibilidades e caminhos discursivos outros, como mostram Peixoto, Kemmerich e Souza (2023). Com o objetivo de identificar efeitos do nosso discurso docente, como professores de matemática em formação, na atuação de um profissional tradutor e intérprete não formado na área de exatas, realizamos uma aula, via Google Meet, que tinha como objeto matemático as medidas de áreas. Utilizamos como referencial teórico-metodológico a Boa Construção Discursiva de Oliveira e Machado (2023). A aula foi construída pela primeira autora, com o uso de tecnologias digitais visuais, sob os princípios da BCD, e apresentada e interpretada pelo profissional tradutor e intérprete. Após a aula, em conjunto levantamos alguns problemas e gatilhos de problemas que encontramos durante as construções de escolhas discursivas. Buscando sair de nossa zona de conforto, apresentamos algumas de nossas reflexões na construção da aula com o tradutor e intérprete. Assim, como ouvintes, nossas escolhas discursivas são ponderadas com base em nossa ancoragem linguística. Desse modo, durante a aula, os conceitos de retângulo e base foram evocados e considerados como parte do conhecimento enciclopédico do intérprete, o que demandou um esforço de memória e esforço de compreensão, como destaca Gile (2009), que poderia ter sido evitado se a densidade informacional fosse reduzida ao entregar redes de significação do conceito ao intérprete, como defendem Oliveira e Machado (2023). Observamos que em ambientes linguísticos oralizados (ALO) a não manifestabilidade mútua, com relação ao discurso construído, entre o professor e intérprete, pode ocasionar problemas de tipo ocasional no ambiente linguístico traduzido (ALT). Assim, acreditamos que perguntas como, “O que é base?’, “Altura e comprimento podem ser base de uma figura geométrica?” e “O que queremos dizer, matematicamente, quando perguntamos, qual a relação entre essas áreas?" precisam ser acuradas para que na reformulação interlingual a equivalência proposicional possa acontecer e alunos surdos e não-surdos possam ter acesso ao mesmo conceito matemático. Acreditamos que um discurso matemático construído de forma que entregue redes de significação ao intérprete educacional pode minimizar os elementos disruptivos, como os problemas ocasionais, que podem levar para que o conhecimento matemático seja construído de forma divergente nos ambientes bilíngues traduzidos. Para isso, reconhecer que o lugar de privilégio ouvinte pode desequilibrar o sistema didático, quando este conta com a presença do intérprete educacional, apresenta-se como condição necessária rumo à inclusão linguística de alunos surdos e não-surdos.
Referências
GILE, Daniel. Basic Concepts and Models for Interpreter and Translator Training. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins, 2009.
OLIVEIRA, Janine. Soares de; MACHADO, Rosilene Beatriz. A aula é de matemática! E agora? A importância do conhecimento extralinguístico para uma boa construção discursiva em Libras por parte do intérprete educacional. Cadernos de Tradução, Florianópolis/SC, v. 43, n. 1, p. 1-32, 2023.
PEIXOTO, Aniel; KEMMERICH, Sidiane; SOUZA, Douglas Willian Nogueira de. Cenas
de um ambiente oralizado traduzido e de um ambiente sinalizado traduzido: águas que
escorrem do interior de sistemas didáticos que pretendem ser inclusivos. In: ENCONTRO
NACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA INCLUSIVA, 3., 2023, Vitória. Anais
[...]. Vitória: Instituto Federal do Espírito Santo, 2023. p. 1-12.
SOUZA, Douglas Willian Nogueira de; BITTAR, Marilena; BORGES, Fábio Alexandre. Níveis de co-determinação em sistemas didáticos ampliados com foco na matriz de experiência da surdez. In: ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA INCLUSIVA, 3., 2023, Vitória. Anais [...]. Vitória: Instituto Federal do Espírito Santo, 2023. p. 1-12.
WITCHS, Pedro. Henrique.; ZILIO, Virgínia. Maria. Ambientes linguísticos possíveis da educação de surdos no Brasil a partir das políticas educacionais inclusivas. In: ALBRES, Neiva. Aquino.; COSTA, Mairla. Pereira. Pires. Interlocuções sobre a língua de sinais e educação de surdos. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, 2021. p. 31-45.