A INFLUÊNCIA DO GÊNERO NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA:

DESAFIOS E PERCEPÇÕES

Resumo

Ao debater o conceito de gênero nas pesquisas educacionais em suas diferenças e implicações, apontam Souza e Fonseca a importância da categoria de análise para a Educação Matemática. A compreensão sobre o conceito de gênero é fundamental para entender historicamente as discussões sociológicas e as suas percepções educacionais. Essa categoria de análise não apenas esclarece as dinâmicas de poder presentes nas relações educacionais na matemática, mas também permite a identificação de formas sutis e explícitas de perpetuação de desigualdades, que afetam tanto a construção quanto a disseminação do conhecimento matemático, perpetuando exclusões baseadas em uma visão restritiva e hierárquica de gênero.Podemos perceber as desigualdades de gênero, no nosso cotidiano, por meio de atitudes, comportamentos, falas e discursos vivenciados, por exemplo, no ambiente escolar. O fato de essas disparidades serem percebidas no contexto escolar parece ser um sinal de que a discriminação de gênero continua presente não só na escola, mas, também, de forma mais geral, na sociedade. Em muitos casos, essas discriminações são normalizadas ou naturalizadas, o que reforça estereótipos e preconceitos profundamente enraizados. Essa naturalização pode ser vista na ausência de questionamentos sobre práticas pedagógicas que reforçam uma divisão entre "saberes masculinos" e "saberes femininos", contribuindo para a manutenção de uma hierarquia que valoriza certas competências, como o raciocínio lógico e abstrato, frequentemente associadas aos homens, em detrimento de outras, igualmente valiosas, porém menos reconhecidas. A nosso ver, essa situação se torna ainda mais complicada porque muitas vezes, é “mascarada”, ao passo que legitimada em ações cotidianas, como, por exemplo, na reprodução de afirmativas como “homens são melhores em Matemática que as mulheres” e suas variações. Assim, muitas discrepâncias sociais têm sido aceitas sem estranhamento, como se fossem naturais, isto é, como ocorrências inerentes aos homens e às mulheres (OLIVEIRA, OLIVEIRA, 2017). A Matemática continua sendo produzida, em grande medida, pelas lentes masculinas, em geral mecanizada, reforçadora de valores de um certo grupo (portanto, a serviço da manutenção dos privilégios desse grupo) e vista como uma ciência “neutra” em uma sociedade androcêntrica (Skovsmose, 2018). Esse caráter "neutro" atribuído à Matemática não reconhece que o próprio processo de construção do conhecimento matemático está imerso em valores culturais, sociais e políticos, muitas vezes invisibilizando as contribuições de mulheres e outros grupos marginalizados. Ao negligenciar essa perspectiva, não estaríamos limitando o desenvolvimento de novas formas de pensar a Matemática? Como uma ciência que se autoproclama neutra pode ser utilizada de forma mais crítica para questionar estruturas de poder, em vez de reforçá-las? Esse discurso reverbera em outras esferas na sociedade, como nas escolas e até mesmo nas escolhas de suas profissões. Com esse pensamento, ilustramos como o gênero surge em favor de perpetuar padrões na Matemática ao pressupor alguns traços para a masculinidade que são negados à feminilidade, como a rapidez, a dominância, a detenção “do” saber e “a” lógica (Souza 2008). Acerca desse saber e dessa lógica a autora Souza (2008) em sua tese ressaltar que existem explicações para ambos serem mais reconhecidos em homens que em mulheres. De um lado, os homens os “detêm” porque, em geral, são produções de homens, para a dominação dos homens, com o olhar dos homens das classes dominantes, que, portanto, estabelecem padrões do masculino dominante. Essa construção histórica de um saber masculinizado reforça não apenas a exclusão de mulheres, mas também cria uma barreira para que outras formas de pensar e interpretar o conhecimento matemático sejam validadas. De outro lado, sobre esse saber e essa lógica, torna-se imperativo elucidar que a estrutura sexista que favorece que os homens os detenham deles, se não impede, dificulta a possibilidade de serem “dóceis, passivos e emotivos”. Isso porque lhes legaria uma (indesejada) vulnerabilidade em sociedades androcêntricas, capitalistas que valorizam a acumulação, o domínio e a exploração. Além disso, será que a resistência dos homens em adotar características tidas como "femininas" não poderia estar limitando seu próprio potencial de evolução no campo científico? Se a Matemática fosse entendida como uma disciplina mais aberta a diferentes formas de pensar e sentir, não poderia ela se tornar mais inclusiva e até mais produtiva para a sociedade como um todo? Esse processo de exclusão das características atribuídas ao feminino também impacta a forma como o saber matemático é ensinado e percebido, criando barreiras para a inclusão de mulheres e outros grupos que não se encaixam no modelo masculino dominante. Essa visão reducionista limita o potencial transformador da Matemática, que poderia, ser uma ferramenta de emancipação e questionamento das estruturas de poder estabelecidas.

Biografia do Autor

Luiza Batista Borges, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Possui graduação em Licenciatura de Matemática pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (2018), foi bolsista pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência (PIBID) em Matemática. Desenvolveu um projeto em 2018 abordando a temática estatística com a violência de gênero, na perspectiva feminista. Abordando a subnotificação dos dados, referente violência contra as mulheres. Foi membro do grupo de Estudos GECI -"Corpo e Interseccionalidade", desde 2020. Atualmente é mestre pelo Programa de Mestrado Acadêmico em Educação Matemática, pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Onde tem interesse em pesquisar sobre o gênero na educação matemática. Tem experiência como pesquisadora em Educação com ênfase em Educação Matemática, com interesse principalmente nos seguintes temas: estatística; interdisciplinaridade; feminismo; violência contra mulher; debate de gênero.

Luzia Aparecida de Souza, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Mãe do Francisco desde 2013. Possui graduação em Licenciatura em Matemática pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2003), mestrado e doutorado em Educação Matemática pela Universidade Estadual Paulista, campus de Rio Claro. Realizou Pós-Doutorado na Escola de Educação na Universidade de Cape Town (África do Sul) de agosto de 2019 a julho de 2020. É coordenadora do Grupo História da Educação Matemática em Pesquisa e membro do Grupo de História Oral e Educação Matemática - GHOEM. É professora associada do Instituto de Matemática e atua como docente no Programa de Pós Graduação em Educação Matemática da UFMS, campus de Campo Grande. Trabalha com pesquisa em Educação Matemática, principalmente nos seguintes temas: História e Filosofia da Educação Matemática, Narrativas e História Oral.

Referências

SOUZA, M. C. Gênero e matemática(s) - dos jogos de verdade nas práticas de numeramento de alunas e alunos da educação de pessoas jovens e adultas.' 01/08/2008 279 f. Doutorado em educação Instituição de Ensino: Universidade Federal De Minas Gerais, Belo Horizonte Biblioteca Depositária: Faculdade de Educação.

SKOVSMOSE, O. Interpretações de significado em educação matemática. Bolema: Boletim de Educação Matemática, v. 32, p. 764-780, 2018.

OLIVEIRA, G; OLIVEIRA, D. desconstruindo práticas sexistas no ambiente escolar. O professor PDE e os desafios da escola pública paranaense. (2012) Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/cadernospde/pdebusca/producoes_pde/2012/20 12_ufpr_hist_artigo_gisele_dalagnol.pdf>.

Publicado
2024-12-12
Seção
Resumo Expandido – Pôster - XVIII SESEMAT - 2024