CORPO, ANCESTRALIDADE, TERRITÓRIO E MEMÓRIA

TENSIONAMENTOS ENCRUZILHADOS FRENTE À EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

  • Célia Raimundo UNESP

Resumo

Esse poster apresenta uma pesquisa desenvolvida no âmbito do mestrado que investiga práticas corporais e espaciais performadas por mulheres negras nas Giras de Exu, no terreiro de Candomblé Ilê Iyá Omi Asé Oiyá Bocossun (Rio Claro/SP). As práticas estudadas produzem concepções de espaço, conhecimento e saber que confrontam paradigmas racionalistas e des(in)corporados ainda predominantes na Educação Matemática (EM). Parto da  hipótese de que essas práticas ativam memórias ancestrais fundamentais nos processos de ressubjetivação coletiva e de cura das epistemes colonizadas. Entendemos que essas práticas configuram processos de ressubjetivação coletiva e de cura, que compreende o corpo enquanto território de memória, espiritualidade e resistência. A pesquisa se ancora em uma perspectiva contra-colonial do conhecimento, trazida por Nêgo Bispo (2023) e nas mesmas águas de caminhos inesperados as quais navega Carolina Tamayo (2021), confluímos para dentro do campo da EM, e nos tornamos mais gente. Nos deixamos tocar pela brisa a acariciar a face, como as palavras que Ulisses Dias da Silva (2025) decanta no papel num momento de (in)subordinação. É um movimento que nos permite a construção de matemáticaS do Incomensuráveis para os corpos que estão a narrá-la, pela oralitura do corpo-palavra. O movimento do Candomblé enquanto um reestruturador da própria imagem cultural do povo africano, estabelece os próprios acordos com seus próprios interesses do ser pessoa, visa estruturar através de um método contra-colonial e pós-qualitativo, o traçado dessa escrevivência por sobre o papel. Me entendendo sempre como sujeito, cardiografando o olhar de quem faz o escrevido. A observação participante nas giras de Exu, o registro em diário de campo e a escuta atenta e ativa dessas mulheres que se manifestam nesses rituais, são bases metodológicas do desenvolvimento dessa escrita. A pesquisa se preocupa principalmente em respeitar os tempos e os códigos próprios do terreiro, reconhecendo os limites entre o que pode ou não ser registrado, compartilhado ou analisado academicamente. Exu se faz método, é potência encarnada, desencarnada capaz de gerar afetos que transcendem o cartesianismo e reconstroem nossa subjetividade a partir da manifestações de memórias encarnadas no corpo. Nossos estudos são fundamentados e assentados nas palavras das matriarcas do axé Iyá Detá, Iyá Kalá e Iyá Nassô - fundadoras do primeiro terreiro de Candomblé no Brasil - as quais nos permite resgatar o território, resgatar África no e pelo corpo. Para pensar o corpo no traçado costurado ao território compomos junto a Beatriz Nascimento (2018) o conceito de corpo-documento, anunciando através de artigos como Sistemas Sociais Alternativos Organizados pelos Negros e documentários como Orí o potente métodos organizativos de promoção e gestão do espaço feita pelo povo negro. Conceição Evaristo (2020) nos dá tinta preta na caneta, nos possibilita compor estruturas escreviventes do corpo, e nas encruzilhadas espiralares de Leda Maria Martins (2021) nos ORÍentamos em um novo caminho, de afetações sentidas por, para e com Exu. O Ilê Iyá Omi Asé Oiyá Bocossun, fundado em 1954 é mais do que um local de práticas religiosas, é um território, um lugar de produção de conhecimentos, saberes, e assentamento de epistemologias abafadas, silenciadas e genocidadas pelo processo colonial, é onde silenciosamente o corpo se encontra com a terra, e dança. É um corpo, que dançando, performa sua reza mais genuína. Faz do corpo portal de comunicação ancestral.

Publicado
2025-08-27
Seção
Resumo Expandido – Pôster - XIX SESEMAT - 2025