O LU(g)AR dos sertões

  • Gilberto Mendonça Teles Mendonça Teles PUC-Rio

Resumen

A palavra2 sertão tem servido, em Portugal e no Brasil, para designar o “incerto”, o “desconhecido”, o “longínquo”, o “interior”, o “inculto” (terras não cultivadas e de gente grosseira), numa perspectiva de oposição ao ponto de vista do observador, que se vê sempre no “certo”, no “conhecido”, no “próximo”, no “litoral”, no “culto”, isto é, num   lugar privilegiado — na “civilização”. É uma dessas palavras que traz em si, por dentro epor fora, as marcas do processo colonizador. Ela provém de um tipo de linguagem em que o símbolo comandava a significação (re)produzindo-a de cima para baixo, verticalmente, sem levar em conta a linguagem do outro, do que estava sendo colonizado. Refletia na América o ponto de vista do europeu — era o seu dito (ou seu ditado), enquanto nas florestas, nos descampados, nas regiões tidas por inóspitas, de vegetação difícil, se ia criando a subversão de um não-dito nativista e sertanista que se tornou um dos mais importantes signos da cultura brasileira, sobretudo depois que Euclides da Cunha, no início do século XX [1902], publicou o seu livro magistral, Os sertões, escancarando a realidade brasileira para os próprios brasileiros que, durante todo o século XX, discutiu  e louvou este livro, pondo sempre em evidência a sua linguagem, mas sem compreender bem os sentidos latentes na tortuosidade de uma escrita que a crítica, apalermada, pensou fosse uma “prosa parnasiana”, tratando logo de classificar o livro como “romance” [José Veríssimo e João Ribeiro], como “epopéia” [Afrânio Peixoto]e até como  “poesia”[José Veríssimo]. Afrânio Coutinho chega ao cúmulo da baianidade, no fim de sua vida, a pôr Os sertões no gênero épico, ao lado de Os lusíadas, do Uraguai, do Caramuru, em vez de incluí-lo entre os grandes ensaios brasileiros. Confundia a metáfora hiperbólica “a epopéia de Canudos” com a sua falta de rigor no estudo do texto de Euclides da Cunha.

Citas

AMORA, Antônio Soares. História da literatura brasileira. São Paulo: Saraiva, 1984. ANCHIETA. Informação do Brasil e de suas capitanias [1584]. São Paulo: Obelisco, 1964. ANTONIL, André João. Cultura e opulência no Brasil. São Paulo: Melhoramentos, 1976. BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira.São Paulo: Cultrix, 1991.

CAMINHA, Pêro Vaz de. A carta. Lisboa: Comissão Executiva das Comemorações do V Centenário do Nascimento de Pedro Álvares Cabral, 1968.

CAMÕES, Lvis de Os lvsíadas. Lisboa: Imprensa Nacional / Casa da Moeda, 1982. Fac- similada.

CAMONGO. Saciologia goiana. Guarabira, PB: Tipografia Pontes, 1980.

CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil. Rio de Janeiro: J. Leite & Cia., 1925.

CARVALHO, Ronald de. Pequena história da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Briguiet, [1919]1955.

CASTELLO, José Aderaldo. A literatura brasileira: Origem e Unidade. São Paulo: EDUSP, 1999.

CASTRO, Sílvio. História da Literatura Brasileira. Lisboa, Alfa, 1999, vol. II

COELHO NETO. Compêndio de literatura brasileira. 3ª ed. Rio de Janeiro: Fran. Alves 1929. COUTINHO, Afrânio. Introdução à literatura no Brasil. Rio de Janeiro: São José, 164. As formas da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Bloch, 1984.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. 23ª edição.Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1954. Obra completa, dois volumes. Rio de Janeiro: Aguilar, 1966.

FREITAS, Bezerra de. História da literatura brasileira. Porto Alegre: O Globo, 1939. GÂNDAVO. Pero de Magalhães. Tratado da terra do Brasil. São Paulo: Obelisco, 1964. História da Província Santa Cruz a que vulgarmentechamamos Brasil. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1984. Edição fac-similada.

LÉRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. São Paulo: Martins, 1941.

MAGALHÃES, Couto de. O selvagem. 4ª edição.São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1940. MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira. São Paulo: Cultrix, 1978. Vol. V. MERQUIOR, José Guilherme. De Anchieta a Euclides. Rio de Janeiro: José Olympio, 1977.

MIGUEL-PEREIRA, Lúcia. Prosa e ficção (de 1870 a 1920). Rio de Janeiro: José Olympio, 1957.

MOISÉS, Massaud. História da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1984.

OLIVEIRA, José Osório de. História breve da literatura brasileira. São Paulo: Martins, 1939.

PEIXOTO. Afrânio. Noções de história da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Fran. Alves, 1931.

PEIXOTO.Panorama da literatura brasileira. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1940.

PICCHIO, Luciana Stegagno. História da literatura brasileira. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1997.

RAMOS, Hugo de Carvalho. Tropas e boiadas. Goiânia: UFG, 1997. 8ª edição, preparada por Gilberto Mendonça Teles.

ROMERO, Sílvio. História da literatura brasileira. 45ª edição, tomo V. Rio de Janeiro: José Olympio, [1888] 1954.

ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1956.

SALVADOR, Frei Vicente do. História do Brasil. 1500-1627. São Paulo: USO / Itatiaia, 1982.

SODRÉ, Nelson Werneck. História da literatura brasileira. Seus Fundamentos Econômicos. Rio de Janeiro: José Olympio, 1938.

SOUSA, Gabriel Soares de. Tratado descritivo do Brasil em 1587. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1987.

STADEN, Hans. Duas viagens ao Brasil. São Paulo: USP / Itatiaia, 1974. TAINE. Introduccion à l’Histoire de la littérature anglaise. Paris: [?], 1864.

TELES, Gilberto Mendonça. Camões e a poesia brasileira. 4ª ed. Lisboa: Imprensa Nacional- Casa da Moeda, 2001. A escrituração da escrita. Rio de Janeiro: Vozes, 1996.

THEVET, André. As singularidades da França Antártica. São Paulo: USP / Itatiaia, 1978.

VERÍSSIMO, José. Estudos de literatura brasileira. 5ª Série. Belo Horizonte: Itatiaia, [1916]

Publicado
2017-08-30